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quarta-feira, 29 de outubro de 2014

Rede Brasileira do Pacto Global promove debate do papel de empresas no desenvolvimento sustentável

Entre 03 e 05 de novembro, o evento em São Paulo busca compartilhar aprendizados sobre questões fundamentais para uma gestão mais justa e responsável, com a participação de convidados internacionais.
O que a sustentabilidade corporativa tem a ver com o futuro do planeta e com a carreira dos profissionais? Como as organizações podem ser parceiras na construção de um novo modelo de desenvolvimento sustentável? Esses serão alguns dos temas em destaque da Estação Sustentabilidade da HSM ExpoManagment 2014, que pela primeira vez terá curadoria assinada pela Rede Brasileira do Pacto Global, representante da iniciativa empresarial das Nações Unidas no país.
Entre os dias 3 e 5 de novembro, a Estação Sustentabilidade apresenta em São Paulo sete painéis gratuitos com o tema “O futuro é global”. A programação busca compartilhar aprendizados sobre questões fundamentais para uma gestão mais justa e responsável, com a participação de convidados internacionais como a do diretor executivo do Pacto Global da ONU, Georg Kell, e o cofundador do movimento Capitalismo Consciente, Raj Sisódia.
Na abertuda do evento, a programação aborda igualdade de gênero nas empresas, negócios inclusivos e sustentabilidade nas PMEs. No dia 4, é a vez de debater o papel do setor privado na redução de impactos do aquecimento global. Na mesma tarde, o representante do Pacto Global da ONU participa de painel sobre Anticorrupção.
No último dia, o público pode conferir dois painéis: liderança responsável e capitalismo consciente. Esse último trará uma roda de conversa entre altos executivos brasileiros e Raj Sisódia, professor indiano da Universidade de Bentley (Boston, EUA) e um dos convidados especiais do auditório principal desta edição da HSM ExpoManagement.
Com formato aberto à participação do público, os painéis trazem ainda casos práticos de empresas de diversos portes que já foram reconhecidas por seus esforços na promoção de valor compartilhado. “Para as Nações Unidas, o setor empresarial é um grande protagonista do desenvolvimento sustentável. Ao participar da HSM ExpoManagement, queremos disseminar esses valores para um amplo público de profissionais que podem fazer a diferença em suas organizações e atuar em parceria com governos e sociedade”, disse a diretora executiva da Rede Brasileira do Pacto Global, Renata Seabra.
O evento também contará com a presença da jornalista e empresária, Ana Paula Padrão, o fundador da Embraer, Ozires Silva, o fundador da Yunus Negócios Sociais, Rogerio Oliveira, o CEO Itaipu Binacional, Jorge Samek e o vice-presidente da Braskem, Marcelo Lyra, entre outros executivos e especialistas de diversas áreas do conhecimento.
O Transamérica Expo Center também irá receber, no dia 4 de novembro, o Encontro Anual da Rede Brasileira do Pacto Global 2014, exclusivo para organizações e empresas signatárias da iniciativa no país. O evento contará com a participação do coordenador-residente do Sistema ONU no Brasil, Jorge Chediek, e terá como foco inovação e liderança para a sustentabilidade, apresentando oportunidades para atuação do setor privado no contexto da nova agenda de desenvolvimento sustentável das Nações Unidas.

segunda-feira, 29 de setembro de 2014

'Pobres e ricos têm tratameto idêntico em sistema único no Canadá', diz médico brasileiro


Com passagem pelo SUS (Sistema Único de Saúde) no Paraná e há mais de 10 anos atuando no Canadá, o médico brasileiro Fabio Cury acumula experiência nos dois sistemas públicos de saúde e acredita que o Brasil poderia aproveitar alguns aspectos do modelo canadense.

Para Cury, que é especializado em rádio-oncologia - o tratamento do câncer com radiações ionizantes (também conhecido como radioterapia) - uma das grandes diferenças entre os dois países é a presença, no Brasil, de dois sistemas de saúde, um público e outro privado, diferentemente do que acontece no Canadá.
“A vantagem de ter um sistema único realmente único (como acontece no Canadá) e não ter um sistema paralelo, como o sistema privado ou o plano de saúde, é que todo mundo tem que ser tratado, e bem tratado, sob aquele sistema (público)”, disse Cury à BBC Brasil.
“(No Canadá) Toda a população tem acesso aos mesmos tratamentos, aos mesmos médicos, independentemente da sua classe social. É diferente do Brasil, onde uma pessoa com mais recursos será tratada em um hospital particular, e outra, com menos recursos, às vezes não será sequer tratada, ou será tratada em um hospital com menos tecnologia”, diz.

Sistema público
Cury explica que todos os canadenses, independentemente da situação financeira, usam o sistema público para serviços médicos e atendimento hospitalar. O gasto com saúde já está incluído no Imposto de Renda, de acordo com os rendimentos de cada um. Na hora de receber o atendimento, geralmente não é preciso desembolsar nada.
Mesmo no caso de uma clínica de propriedade privada, o pagamento pelo tratamento será feito pelo governo, dentro do sistema público de saúde, e não pelo paciente. O sistema privado pode ser usado apenas para alguns serviços, como testes e diagnósticos, algumas cirurgias estéticas ou tratamento odontológico.
Cury faz uma comparação com a situação no Brasil, onde, dependendo dos recursos financeiros, os pacientes vão optar pelo SUS, por planos de saúde ou por pagar pelo tratamento integralmente.
“No tratamento do câncer, por exemplo, há drogas que o SUS não cobre, e o convênio cobre. Ou só tem acesso se pagar. Então essa pessoa (com mais recursos financeiros) vai receber um tratamento diferenciado do que aquele que está lá pelo SUS (no Brasil)”, afirma.

Transição
Para Cury, uma possível maneira de elevar a qualidade do sistema público de saúde no Brasil seria melhorar salários e equipamentos, até que houvesse uma transição natural dos pacientes do sistema privado para o público.
“Quando (o tratamento pelo SUS) chegasse no mesmo nível dos grandes hospitais, talvez o paciente particular olhasse com outros olhos, visse que poderia fazer o tratamento de graça e com a mesma qualidade e no mesmo tempo”, destaca.
O brasileiro ressalta que os hospitais públicos no Canadá, ao contrário de muitos no Brasil, são equipados com tecnologia de ponta, acessível a todos os pacientes, ricos ou pobres.
“O investimento em tecnologia poderia fazer o sistema público do Brasil se tornar algo mais próximo do que o que existe aqui fora. Porque os profissionais do Brasil são bem treinados, de maneira geral”, afirma o brasileiro, que integra a equipe do Montreal General Hospital, parte do McGill University Health Center (Centro Universitário de Saúde McGill) em Montreal, na Província do Québec.

Espera
No sistema canadense, todos compartilham dos mesmos benefícios e eventuais desvantagens.
“Aqui toda a população tem acesso a tecnologia de ponta, tratamento de ponta, com as devidas restrições”, resume Cury.
Uma reclamação comum no Canadá é em relação ao tempo de espera para determinados tratamentos, considerado longo – mas, de acordo com Cury, ainda menor que a média no Brasil.
Naquele país, um órgão do governo é responsável por vistoriar e ter certeza de que os prazos são cumpridos.
“Aqui tem fila, mas ninguém morre na fila”, afirma Cury, ao observar que o tempo de espera costuma ser menor que o registrado no SUS, mas maior do que no sistema privado do Brasil ou de outros países.
Ao contrário do que ocorre no Brasil, no Canadá o paciente não tem a opção de pagar mais para ser atendido mais rápido.
Cury observa que há casos de pacientes com mais recursos que acabam, por exemplo, viajando aos Estados Unidos em busca de uma consulta de segunda opinião ou de tratamento mais rápido.
Mas de modo geral, em caso de descontentamento com algum serviço, a reação da população costuma ser reclamar e exigir seus direitos ao tratamento de saúde de ponta.

Ensino e pesquisa
Para o rádio-oncologista, o maior estímulo ao ensino e à pesquisa também são aspectos do modelo canadense que poderiam ser adotados no Brasil.
Outro fator que, na visão de Cury, poderia ser melhorado no Brasil seria a criação de condições para que os profissionais de saúde se dediquem exclusivamente a um determinado local, sem precisar recorrer a dois ou mais empregos para pagar as contas.
“Infelizmente, vejo colegas no Brasil trabalhando em dois ou três lugares. Aqui, a maioria trabalha em um único hospital. É onde você vai ver seus pacientes, vai fazer sua pesquisa e vai lidar com a sua parte de ensino”, afirma.
“A ideia de se ter plano de carreira para um médico, tanto dentro da universidade quanto alguma coisa guiada pelo governo, com salários melhores, com plano de aposentadoria e tudo mais, seria um grande atrativo para o médico brasileiro.”
Formado pela Universidade Federal do Paraná, Cury, de 40 anos, chegou ao Canadá em 2003, após concluir residência no Brasil. Logo depois, surgiu o convite para permanecer no país.
Assim como todos os médicos formados fora do Canadá, ele teve de revalidar seu diploma e fazer diversas provas, inclusive de língua francesa (falada no Québec), para ganhar a permissão para atuar.
O fato de muitos médicos estrangeiros atuarem no Canadá facilitou a adaptação, diz Cury. “Nunca senti preconceito em relação a ser de fora ou em relação a ser brasileiro”, afirma.
“Acho que o aspecto humano do médico brasileiro é uma coisa que chama a atenção de qualquer população. Quando o brasileiro vem para cá, faz sucesso entre os pacientes. Essa forma carinhosa que o brasileiro tem é um ponto positivo.”

Recrutamento de estrangeiros
A demanda por médicos levou o Ministério da Saúde e Serviços Sociais do Québec a criar há mais de dez anos um programa de recrutamento, o Recrutement Santé Québec, para atrair profissionais formados em outros países.
Esses médicos precisam ser aprovados pela ordem profissional de médicos, o Collège des Médicins du Québec, equivalente a um CRM (Conselho Regional de Medicina) no Brasil.
As regras do programa incluem ainda a aprovação em testes e cursos de treinamento, e o recrutamento não vale para áreas universitárias, como Montreal, mas somente para áreas onde há muita demanda.
Segundo a assessoria de imprensa do projeto, desde seu início, em 2003, o programa já recebeu 62 inscrições do Brasil. Desses candidatos, 12 obtiveram licença para atuar no Québec, sendo três recrutados como professores. Atualmente, nove deles permanecem no programa.

Fonte: UOL

quinta-feira, 8 de maio de 2014

Noruega, o país mais próspero do mundo

Em 100 anos, passou de um dos países mais pobres da Europa para ser sinônimo de riqueza e justiça social, com um PIB per capita de US$ 100 mil

Como milhões de imigrantes pelo mundo, Simone Brannstrom decidiu deixar seu país em busca de uma vida melhor. Acabou encontrando trabalho num restaurante no Porto de Tonsberg, cerca de 100 quilômetros de Oslo, na Noruega. "Aqui ganho muito mais que em meu país", diz Simone. Mas ela não vem da África, do Sudeste Asiático ou de algum país empobrecido. Loira, de olhos azuis e sorriso fácil, Simone vem da Suécia, um dos países mais ricos do mundo. Ela e milhares de outros jovens suecos optaram nos últimos anos por cruzar a fronteira e trabalhar na Noruega, espécie de oásis regado a petróleo.
Quarenta anos depois da descoberta do petróleo no Mar do Norte, a Noruega conseguiu traduzir esse recurso natural em prosperidade e igualdade. Pela primeira vez em 2014, um país terá um Produto Interno Bruto per capita acima de US$ 100 mil e, segundo a ONU, jamais uma sociedade atingiu nível de desenvolvimento humano igual ao de Oslo. O salário mínimo é de 4,8 mil, cerca de R$ 14 mil, o desemprego é de 2% e, mesmo em uma era de austeridade, o sistema do bem-estar social se manteve intacto.
A Noruega foi um dos poucos países a atravessar a crise global sem grandes impactos e, nas últimas eleições, o único debate era o que fazer com o dinheiro que sobra nos cofres públicos.
Ao contrário do que o petróleo causou no Oriente Médio ou Venezuela, o dinheiro desse recurso natural foi administrado de forma a criar uma situação inédita. Em 100 anos, a Noruega deixou de ser um dos países mais pobres da Europa, convivendo com o gelo e a escuridão por metade do ano, para se transformar em sinônimo de riqueza e justiça social. 
"Para muitos países, a descoberta do petróleo foi um problema. Mas nós conseguimos administrá-lo bem", declarou ao Estado Erling Holmoy, chefe da divisão de Estatísticas do governo da Noruega.
As contas demonstram isso. O país tem o maior fundo soberano do planeta, estimado em US$ 815 bilhões e os cofres do Estado estão abarrotados. O Estado norueguês comprou 1% de ações em bolsas de todo o mundo, investe em 3,2 mil empresas e, com apenas metade de seu superávit, poderia quitar as dívidas da Grécia. "A realidade é que estamos nadando em dinheiro", declarou Frode Rekve, que comanda o Instituto Norueguês de Mídia.
Hoje, a renda gerada pelo petróleo chega a US$ 40 bilhões por ano ao Estado. Um a cada três dólares obtidos pelas autoridades em Oslo vem do subsolo marinho. Mais da metade das exportações vem do setor de energia e o país já é o oitavo maior exportador mundial. Em termos per capita, a produção de barris na Noruega chega a ser superior à da Arábia Saudita.
Independente apenas desde 1905, a Noruega rejeitou em duas votações nos últimos 40 anos a ideia de fazer parte da União Europeia.
Estatais. Mas o modelo norueguês também tem outro componente: a forte presença do Estado em praticamente todos os campos da economia. Segundo especialistas, essa tendência começou depois da 2.ª Guerra Mundial, quando o governo nacionalizou empresas ligadas à Alemanha. Assim, o Estado ficou com 44% das ações da Norsk Hydro, tem participação de 37% na Bolsa de Valores de Oslo e em dezenas de empresas.
O capitalismo de Estado fez com que economistas ironizassem a situação chinesa. Uma piada contada entre analistas aponta que, no fundo, o modelo desenvolvido pelo Partido Comunista Chinês nos últimos dez anos não passa de uma cópia do modelo norueguês existente há meio século. Hoje, o Estado controla a petroleira Statoil, o grupo de telecomunicações Telenor, a fabricante de fertilizantes Yara, e o maior banco do país, o DnBNor.
Os sinais de prosperidade podem ser vistos em qualquer segmento. No início do ano, o governo da Noruega inaugurou uma ponte que acabou com o isolamento de um vilarejo com 74 moradores, no centro do país. A obra custou US$ 20 milhões.
As contas positivas e o sentimento de que os recursos são de todos também transformaram a maneira pela qual empregados e patrões negociam. Em Oslo, nada é como no resto do mundo. Os sindicatos, por exemplo, negociam a cada ano seus salários, dependendo das necessidades do setor exportador e para garantir que o produto nacional continue competitivo no mercado global. Nas eleições, partidos prometem não cortar impostos.
O sistema de bem-estar social permite que os homens cuidem de seus bebês e, a cada ano, o governo destina 2,8% do PIB para apoiar famílias em tudo que precisam para ter filhos. Mesmo aqueles que decidem não levar as crianças para creches recebem, a cada mês, um cheque de 200 para ajudar nos gastos.
A lei estabelece uma licença-maternidade de nove meses para a mãe, mas também quatro meses de licença para os pais. Nesses meses, quem paga o salário dos pais é o Estado. No ano passado, dois ministros do governo chegaram a se afastar de seus cargos pelo prazo determinado em lei, justamente para cuidarem de suas crianças.
Na avaliação do governo, esse incentivo para as mulheres e leis para garantir a igualdade de gênero são positivas para a economia. Hoje, empresas são obrigadas a dar 40% das vagas em seus conselhos para mulheres. Setenta e cinco por cento delas trabalham fora e, para o governo, isso representa maior atividade na economia e um número maior de pessoas pagando impostos.
Em recente entrevista ao New York Times, o primeiro-ministro norueguês, Jens Stoltenberg, foi taxativo. "A lição da Noruega é a participação feminina na economia. Isso ajuda no crescimento, nas taxas de natalidade e no orçamento", declarou.
O imposto de renda é elevado, atingindo 42%. Mas existe um consenso de que o valor é justo para manter o sistema e que, de uma certa forma, tudo é devolvido em serviços. O Estado paga do berçário ao enterro, financia estudantes e até banca férias.
Fonte: Estadão

domingo, 29 de abril de 2012

Entrevista com Amartya Sen: "Mercados, justiça e liberdade"


Para o prêmio Nobel indiano, a expansão das economias baseadas na livre-iniciativa deve ocorrer ao mesmo tempo em que se ampliam os investimentos sociais feitos pelo governo

Amartya Sen
Amartya Sen: ''O crescimento não deve ser um fim em si, mas um meio de alcançar avanços sociais e beneficiar a população'' 
Amartya Sen, 78 anos, cresceu em uma Índia imersa na ruína econômica e social. Filho de um professor universitário, conviveu com a miséria extrema, a sangrenta guerra separatista do Paquistão, o desmonte do Império Britânico e viu a fome matar pelo menos 3 milhões de pessoas em Bengala. Em 1998, ele recebeu o Nobel de Economia por sua formulação original sobre o desenvolvimento, processo que passou a ser visto como uma extensão das liberdades para trabalhar, consumir, dispor de saúde e educação de qualidade e expressar livremente os pensamentos. Graças a Sen, um dos criadores do Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), o avanço dos países não é mais medido apenas pelo crescimento da economia. Ele esteve em São Paulo como palestrante do encontro Fronteiras do Pensamento.
A última vez que o senhor esteve no Brasil foi há mais de dez anos. Qual a sua avaliação da evolução brasileira nesse período? A economia brasileira passa por um bom momento. Não falo apenas em termos de crescimento, que permanece mais robusto do que aquele visto na Europa e nos Estados Unidos. O importante é que o país tem distribuído os recursos gerados pelo aumento de sua riqueza. Houve uma melhora indiscutível nos indicadores sociais. Agora, para sustentar o crescimento e consolidar os avanços conquistados, será preciso aprimorar a educação e também o sistema público de saúde, tanto em termos de cobertura da população como no que diz respeito à qualidade.
Mas o Brasil cresce em uma velocidade inferior à de outros países em desenvolvimento... O Brasil realmente não vem crescendo tão rápido quanto a China ou mesmo a Índia, mas exibe muitas vantagens em relação àqueles países. A China enfrenta uma constante tensão política por não ser um país democrático, embora seja um equívoco atribuir o crescimento da economia chinesa ao autoritarismo. A China cresce rapidamente porque nos últimos trinta anos sua economia é aberta e receptiva aos mercados. A Índia, por sua vez, teve períodos de crescimento tépido, mesmo sendo uma democracia. Passou a avançar mais rapidamente depois que decidiu implantar políticas mais favoráveis aos investidores privados. Mas a renda per capita indiana ainda é muito baixa e os indicadores sociais evoluem lentamente. Nesse aspecto, a evolução verificada na sociedade brasileira tem sido bem mais expressiva.
Por que essa avaliação negativa da Índia, um dos países que mais crescem no mundo?  A economia indiana deverá sentir uma desaceleração, baixando sua taxa anual de expansão dos atuais 9% para algo em torno de 7%. Ainda assim, nos próximos anos, o PIB indiano continuará crescendo em um ritmo superior ao da média mundial. O que mais me preocupa com relação ao futuro da Índia é o fato de o país ter se mostrado incapaz de partilhar os frutos do crescimento. Não me refiro apenas à distribuição da renda. Falo da desigualdade de acesso ao ensino de qualidade. Para uma parte da população, a educação é excelente. Há pessoas capazes de competir em igualdade de condições com trabalhadores de outros países. Não são inferiores em nada, no preparo técnico e científico. Por outro lado, um terço dos indianos não tem acesso a esse sistema educacional mais avançado, enquanto uma parcela ainda maior não consegue sequer entrar no ensino primário. Esse é um quadro de extrema desigualdade. Há muita injustiça também no sistema de saúde. O serviço privado é ótimo, mas boa parte da população não possui cobertura ou assistência de nenhuma natureza.
O senhor começou a estudar o desenvolvimento econômico e social há quase seis décadas. Como avalia a evolução desses indicadores nesse período?  É inegável que houve uma evolução. Os níveis de pobreza estão em queda. Em diversos países, há milhões de pessoas deixando a pobreza e também muita gente enriquecendo. Houve progresso considerável na oferta e na qualidade do ensino, a saúde melhorou, vimos uma queda na desigualdade entre homens e mulheres. Aumentou muito a atenção às questões ecológicas, praticamente ignoradas antes. Ocorreu, no entanto, um retrocesso no que diz respeito à segurança — em parte por causa do extremismo religioso e também por conflitos militares.
Os governos tendem a focar suas ações no estímulo ao crescimento do PIB. Esse deve ser o principal objetivo de um governante? É um erro buscar o crescimento pelo crescimento, sem levar em conta os seus efeitos mais amplos e as suas consequências. É preciso ponderar, entre outros fatores, o impacto ambiental. É fundamental também usar os frutos do crescimento para aprimorar a qualidade de vida da população de maneira abrangente, e não apenas favorecendo certos grupos. A Índia teve uma expansão econômica, nas duas últimas décadas, mais elevada do que a de Bangladesh. A renda per capita indiana é hoje equivalente ao dobro da de Bangladesh. Porém, apesar de ter crescido menos, Bangladesh ultrapassou a Índia em diversos indicadores de desenvolvimento social. Precisamos prestar atenção em como tirar o melhor proveito do enriquecimento do país. O crescimento é um meio extraordinário de alcançar avanços sociais e beneficiar a população em geral, como já apontara Adam Smith (filósofo escocês, 1723-1790).
É um equívoco, então, ver o senhor como um cético do crescimento econômico? Não sou anticrescimento, de maneira alguma. Sou contra o crescimento pelo crescimento, e ofereço todas as minhas críticas àqueles que assim são. Mas àqueles que não buscam nenhum crescimento, como a Europa hoje em dia, minhas críticas são ainda mais severas. Adam Smith estava certo quando observou que o crescimento aumenta a renda da população e assim amplia a capacidade das pessoas de ter acesso a melhores condições de vida. Estava certo também quando disse que o crescimento gera os recursos necessários para que os governos possam exercer as suas atividades essenciais.
Os países europeus sentem o peso do aumento na dívida pública. Nesse caso, faz sentido conter as despesas do governo? Os cortes de gastos, se necessários, precisam ser seletivos. A Europa estaria em uma situação bem mais confortável, neste momento, se perseguisse políticas que estimulassem o crescimento em vez de concentrar seus esforços na austeridade. Nenhum país foi capaz, em toda a história, de reduzir a sua dívida pública em um contexto de ausência de crescimento econômico, como tentam fazer hoje alguns países europeus. Não faz sentido essa ideia de primeiro reduzir o endividamento para em seguida ver a economia avançar. Como resultado, a crise europeia é bem mais severa do que deveria ser. Mas, como disse anteriormente, a busca pelo crescimento não deve ser um fim em si mesmo, e sim uma maneira de aprimorar indicadores sociais, como saúde e educação — e também para reduzir o endividamento público, se preciso.
Qual o papel do estado no desenvolvimento dos países com economia baseada na livre-iniciativa? Desde o fim da II Guerra Mundial, um número crescente de países adotou sistemas econômicos baseados na economia de mercado e na livre-iniciativa. Houve também, ao mesmo tempo, um avanço nos gastos sociais pelos governos. O estado de bem-estar social (welfare state) foi estabelecido pelos europeus. Foram ampliadas as políticas de apoio aos desempregados. A expansão das economias de mercado ocorreu, portanto, simultaneamente ao avanço das políticas públicas de bem-estar social. Em grande medida, um processo se alimentou do outro. O Japão já fizera algo parecido a partir do fim dos anos 1860, depois da Restauração Meiji. Os japoneses deram ímpeto a políticas que favoreciam o crescimento acelerado tendo como base uma economia de mercado, mas com um forte investimento público em educação e saúde. Mais tarde o modelo japonês foi replicado por coreanos, por taiwaneses, por Hong Kong e, finalmente, pela China, depois de 1979. O papel do governo expandiu-se dramaticamente na segunda metade do século XX, ao mesmo tempo em que ocorria a expansão da democracia e das liberdades individuais.
Alguns analistas enxergam no custo elevado do estado de bem-estar social o maior obstáculo à recuperação europeia. Qual a sua avaliação? Discordo. A gigantesca crise financeira de 2008 teve início com falhas no funcionamento dos mercados financeiros. Mas, quando os governos gastaram bilhões para socorrer os mercados, os países acabaram acumulando dívidas colossais. Com exceção da Grécia, talvez, a culpa pela crise não pode ser debitada aos governos. As políticas sociais apenas se tornam um peso para o estado quando a economia permanece estagnada, porque aí não há os recursos necessários para financiar a assistência. Diversos países saíram da II Guerra com elevados níveis de endividamento. Como conseguiram reequilibrar suas finanças? Crescendo. Nos anos 90, o presidente americano Bill Clinton também precisou lidar com uma dívida pública elevada e, mais uma vez, a saída foi o crescimento, e não a austeridade. O frustrante é que essas questões já foram tratadas com grande clareza desde os tempos de Adam Smith. Um estado tem responsabilidades e deveres diante de sua população, e o meio de obter os recursos necessários às suas políticas é o livre mercado. É desse equilíbrio que necessitamos.
O senhor cita Adam Smith como um defensor desse equilíbrio entre estado e livre-iniciativa. Hoje, no entanto, o mais comum é Smith ser lembrado como o formulador do conceito da "mão invisível", a capacidade dos mercados de se autorregularem... Smith foi um pensador radical. Ele recebeu críticas da direita por defender a ampliação das liberdades individuais. Os revo­lucionários franceses devem muito às ideias de Smith. O marquês de Condorcet (filósofo francês, 1743-1794) e sua mulher, Sophie, traduziram textos de Smith para o francês. Qualquer um que defendesse a economia de livre mercado no século XVIII era sem dúvida um radical, porque não havia livre mercado. Mais tarde, quando o livre mercado passou a ser dominante, as pessoas continuaram a ler Smith — mas apenas quatro páginas, se tanto, e ignoraram completamente o resto de sua obra. Temos de ler e reler Smith, sempre.
O debate econômico atual está centrado em duas frentes. Uma, a dos seguidores de John Maynard Keynes (economista inglês, 1883-1946), propõe um aumento dos gastos públicos para estimular a demanda. A outra corrente, representada sobretudo pelos seguidores de Milton Friedman (economista americano, 1912-2006), condena o excesso de intervenções do governo. Quem está com a razão? Esse debate é um equívoco. Os seguidores de Friedman erram ao imaginar que a economia de mercado pode fazer tudo sozinha. É um modelo impossível de ser implementado no mundo real. Os keynesianos erram ao pensar que o mero estímulo da demanda vai resolver todos os problemas econômicos. Keynes tem relevância apenas quando estamos lidando com uma recessão. Mas ele diz muito pouco sobre o papel do governo como propulsor do desenvolvimento. Para saber como deve agir o estado, é preciso buscar respostas em Adam Smith, ou em Arthur Pigou (economista inglês, 1877-1959), que tratou de questões como pobreza, desigualdade, qualidade da moradia, educação. Keynes nada tem a acrescentar a respeito desses temas. O desenvolvimento resulta de investimentos em fatores cruciais como educação, saúde, segurança individual e, é claro, disseminação do conhecimento. Sinto pelos seguidores deles, mas em nenhum desses aspectos Keynes ou Friedman têm muito a dizer.
Que países são exemplos do equilíbrio que o senhor propõe? Não há nenhum país perfeito no mundo. Há lições para tirar de um ou de outro. Ninguém precisa copiar um modelo de país. O essencial é raciocinar a partir das ideias que funcionaram em outros lugares.
Fonte: Veja