sexta-feira, 24 de janeiro de 2014

Como fugir do IOF e levar dinheiro em viagens internacionais

O ano de 2013 terminou com uma péssima notícia para todos nós, viajantes: o aumento no Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) de 0,38% para 6,38% em várias formas de levar dinheiro para o exterior. Além do cartão de crédito, que já tinha essa taxa, passaram a pagar um imposto maior o carregamento de cartão de viagem pré-pago, cheques de viagem, compras com cartão bancário de débito e saques da conta corrente ou com cartão de crédito em outros países.
Com as novas regras, a grande pergunta passou a ser: há alguma forma de evitar o IOF de 6,38% nas viagens? Neste post vamos mostrar que sim e apontar algumas alternativas que pesquisamos ou recebemos de dicas de nossos leitores. Mas como se trata de novas regras e de um assunto bastante complexo, não pretendemos esgotar o assunto, mas convidar a imensa comunidade de leitores do MD a colaborar, com dicas e sugestões. Sem voltar à questão da mudança em si, que já foi esgotada no post anterior, é hora de juntarmos forças e buscarmos soluções que sejam úteis para todos!

1. As novas regras
Antes de mais nada, vamos esclarecer como ficou a cobrança do IOF após as novas regras divulgadas pelo Governo Federal:
- Compras ou saques com cartão de crédito: 6,38% de IOF
- Compras ou saques cartão de débito em conta: 6,38% de IOF
- Carregamento de cartão de viagens pré-pagos: 6,38% de IOF
- Compras de cheques de viagem: 6,38% de IOF
- Compra de dinheiro estrangeiro em espécie no Brasil: 0,38% de IOF

Como podemos perceber, entre todas as formas de pagamento acima a única que não teve o imposto aumentado foi a troca de reais por moeda estrangeira em casas de câmbio ou bancos.Vamos começar por ela.

2. Dinheiro em espécie
Trocar o dinheiro no Brasil passou a ser a forma mais simples e barata de custear sua viagem no exterior. De cara você economiza 6% de IOF em todas as suas compras e pagamentos. Além disso, não se preocupa com taxas bancárias, senhas e com a aceitação de cartões mundo a fora. Mas é claro que o métodos traz desvantagens, sendo a maior dela a falta de segurança e de praticidade de andar com notas e moedas durante a viagem.

Vantagens:
- IOF de apenas 0,38%
- Dispensa o uso de cartões e senhas
- Melhor controle dos gastos

Desvantagens
- Falta de segurança (furtos e assaltos)
- Câmbio ruim (deve piorar a partir de agora)
- Falta de praticidade
- Possibilidade de pegar notas falsas
- Sobras de dinheiro no fim da viagem

Dicas
- Fique atento ao limite de R$ 10 mil que podem ser levados sem declaração à receita Federal (saiba mais aqui). Cheque se há alguma restrição por parte do país que será visitado
- Consulte na Ranking do VET no site do Banco Central as melhores taxas cotações para o câmbio antes de fazer a compra
- Escolha hotéis que tenham cofres e invista em uma bolsa para levar o dinheiro em segurança (doleira)

3. Conta no exterior
Ok, a primeira forma de pagar sua viagem não foi novidade para ninguém. Vamos então à segunda: abrir uma conta no exterior. À primeira vista parece complicado, mas bancos como Banco do Brasil e HSBC oferecem essa possibilidade de forma bem simples para seus clientes.
Quem tem conta no Banco do Brasil pode solicitar a abertura de uma conta no Banco do Brasil Americas, a filial norte-americana da instituição. Trata-se do antigo Eurobank, comprado pelo BB em 2012.
“Você pode ter uma conta corrente sem pagamento de tarifa desde que possua no minimo US$ 1.000 de saldo. A transferência pode ser feita de sua conta do Brasil para sua conta no exterior pela internet, com o IOF de 0,38% e dólar comercial. Você recebe um cartão de débito e pode fazer compras em sites, reserva de hotel, etc. Também pode realizar saques sem tarifas em algumas redes de ATM espalhadas pelos EUA, e pagando em media US$2″, explicou o leitor Felipe Carnot, que há tempos utiliza a conta para fugir do IOF.
Segundo ele, o cartão emitido pode ser usado para saques e pagamentos em viagens a qualquer lugar do mundo sem problemas: “Possuo a conta a mais de um ano, já fiz três viagens aos EUA e uma à Europa, e desde então não compro mais dólar nem euro, nem recarrego VTM. Fico de olho na cotação e se ela abaixa um pouco sempre transfiro (usando internet banking) um montante para minha conta lá”.
Atualização: Muitos leitores nos perguntaram sobre como abrir esta conta. Os clientes Banco do Brasil que moram aqui devem solicitar a abertura por e-mail. Acesse: http://www.bancodobrasilamericas.com/en/contact.aspx e preencha o formulário de contato. Outra dica: o valor deve ser mencionado na declaração do Imposto de Renda.

O HSBC é outra opção bem interessante para quem deseja abrir uma conta no exterior. Além dos Estados Unidos, ele oferece opções em diversos países e ainda os estende os benefícios de sua conta premier no Brasil para sua conta no exterior.
Mais informações no site do BB Americas e HSBC.

Vantagens:
- IOF de apenas 0,38%
- Mais segurança e possibilidade de usar cartão
- Facilidade de movimentação via netbanking

Desvantagens
- Eventuais tarifas bancárias
- Não há como comparar taxas de câmbio: sempre será a do banco
- Ter que abrir e gerenciar uma nova conta

 4. Cartão pré-pago de empresa estrangeira
Alguns leitores citaram esta estratégia e ela é comum nos fóruns especializados em importação: cartões pré-pagos sediados no exterior. O mais comum é o Neteller. Após fazer sua conta, preenchendo um formulário simples, você abre sua conta e envia dinheiro para ela de várias formas. Até dezembro, havia muitas maneiras de fugir do IOF alto por ali, mas com as novas regras a única forma é por meio de transferência bancária internacional.
Você pode utilizar o site para compras virtuais e solicitar um cartão físico de débito Net+ para pagamentos e saques no exterior. Ele tem bandeira Mastercard e é aceito mundialmente sem problemas.
No entanto, é necessário estar atento às tarifas envolvidas, como o custo da transferência – que costuma ser de US$ 20 ou uma fração do montante, vale pesquisar – , taxa de emissão do cartão Net+  e manutenção da conta Neteller em caso de inatividade. Ainda assim é uma maneira de driblar o IOF alto.
Vantagens:
- IOF de 0,38% (nas transferências internacionais)
- Cartão pré-pago, o que facilita o controle dos gastos
- Facilidade em fazer o cadastro e usar a conta

Desvantagens
- Taxas
- Necessidade de envio de cópias de documento para pedir o cartão
- Necessidade de fazer remessas internacionais
- Taxa de câmbio ruim

5. As outras alternativas
Uma regra de ouro em viagens internacionais é sempre ter mais de uma opção de pagamento. Jamais viaje contando apenas com o cartão de crédito, de débito ou apenas com dinheiro em espécie. Tente sempre fazer uma mescla para evitar que uma surpresa faça da sua viagem um pesadelo. Vamos dar uma olhada como ficam as demais opções com o aumento do imposto:
Cartões de crédito - Voltam a ser interessantes, visto que já eram cobrados 6,38% de IOF. O cartão traz os benefícios do acúmulo de pontos, simplicidade no uso e controle de gastos discriminados na fatura. Alguns ainda têm serviços extras, como seguros de viagens incluídos. Além disso, costumam ter uma taxa de câmbio mais atrativa que as demais opções, o que pode reduzir os impactos da tributação. As desvantagens, além do IOF: você fica sujeito à variação cambial desde a compra à data do pagamento da fatura e não são aceitos em todos os lugares – dependendo do país para onde se vai isso é um grande problema. Às vezes os cartões dão problema com relação à senha, já que não há um padrão mundial (alguns bancos usam seis dígitos e outros apenas quatro).
Cartões pré-pagos de viagem - Reúnem todas as desvantagens dos cartões de crédito e nenhuma das vantagens, exceto fugir da variação cambial. Nem sempre, porém, isso é positivo, já que via de regra a taxa de câmbio desses cartões é bem ruim e sempre a há a possibilidade de queda do dólar. Há ainda inconvenientes para se recarregar o cartão estando no exterior e a impossibilidade de parcelar as compras. Com o novo IOF, essa opção perdeu todo o atrativo e é provável que os bancos e corretoras promovam mudanças para manter os cartões vivos. Da forma como estão, só são indicados para quem não quer ter surpresas com as flutuações do câmbio, mas não quer levar dinheiro em espécie.
Saque da conta corrente no exterior - Perdeu parte da vantagem com o novo IOF, pois além dele poderá ser cobrada taxa do seu banco e do ATM no exterior. Melhor ser usado como recurso de emergência ou para pequenas quantias para o fim da viagem, por exemplo, caso seu banco não cobre tarifa de saque.

6. Qual é a melhor alternativa?
Não existe uma melhor alternativa para todas as pessoas. Você precisa avaliar por exemplo se a praticidade do cartão de crédito ou do saque no exterior, vale mais que os 6% da diferença que você gastaria a mais se levasse dinheiro em espécie. Concentre a maioria das compras no meio que você achar mais interessante e tenha umas duas outras alternativas para usar como socorro.
Como dissemos, com as regras novas e tantas variáveis e possibilidades, não pretendemos esgotar o assunto, mas abrir um debate entre os leitores, por isso convidamos a todos a postar suas sugestões e soluções sobre o que pode ser feito para driblar o IOF.

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Proteção ambiental não é considerada princípio absoluto

A Lei Federal 12.651, de 25 de maio de 2012, conhecida como novo Código Florestal, previu a dispensa de instituição de reserva legal em áreas onde haja a instalação de determinados empreendimentos, dentre os quais, os de geração, subestações, linhas de transmissão e de distribuição de energia elétrica.
Tal dispensa ocorreu em virtude da utilidade pública e do interesse nacional dos serviços públicos em questão, vitais não só para o desenvolvimento do país, mas para a segurança, bem estar e saúde da população.
Contudo, referida opção legislativa tem sido questionada com fundamento na suposta ofensa à exigência constitucional de proteção ambiental prevista no artigo 225, da Constituição, da exigência constitucional de que a propriedade atenda à sua função social (artigo 5º, inciso XXIII, e artigo 170, inciso III, ambos da Constituição Federal), bem como no princípio de vedação de retrocesso em matéria ambiental.
A importância da discussão sobre o tema se revela na medida em que a (in)constitucionalidade do parágrafo 7º, do artigo 12, da Lei Federal 12.651/2012, será examinada pelo Supremo Tribunal Federal na Ação Direta de Inconstitucionalidade 4.901 proposta pela Procuradoria-Geral da República. A referida ADI foi distribuída perante o STF em 21 de janeiro de 2013 questionando a constitucionalidade dos artigos 12, parágrafos 4º, 5º, 6º, 7º e 8º; 13, parágrafo 1º; 15; 48, Parágrafo 2º; 66, parágrafos 3º, 5º, incisos II, III e IV, 6º; e 68, todos da Lei Federal 12.651. Em agosto de 2013, o relator, Ministro Luiz Fux, aplicou o artigo 12, da Lei Federal 9.868/1999, a fim de que a decisão venha a ser tomada em caráter definitivo e não na fase de análise cautelar. Neste contexto, até a presente data (janeiro de 2014), todos os dispositivos permanecem em vigor no ordenamento, impondo à Administração Pública o respeito e atendimento obrigatórios, uma vez que seus atos são vinculados à lei.
Em que pesem os sólidos argumentos em contrário, a nosso ver, o parágrafo 7º, do artigo 12, da Lei Federal 12.651/2012, não padece de qualquer vício ou contorno de inconstitucionalidade, e se encontra amparado pelo princípio do desenvolvimento sustentável.
Como já delineado, a Constituição da República, em seu artigo 225, caput, consagra como princípio fundamental a defesa do meio ambiente para as presentes e futuras gerações.
Entretanto, como todos os outros princípios, constitucionais ou infraconstitucionais, a proteção ao meio ambiente não pode ser considerado como princípio absoluto, devendo ser analisado de acordo com a “interpretação sistemática” da Constituição, do seu verdadeiro espírito, e não de forma isolada, como pretendem os defensores da tese da (in)constitucionalidade do parágrafo 7º, do artigo 12, da Lei Federal 12.651/2012.
Isto porque, de outro lado, a Constituição de 1988 elevou a garantia do desenvolvimento nacional a objetivo fundamental da República Federativa do Brasil (artigo 3°, inciso II), e também proclama que a ordem econômica tem por fim assegurar a todos uma existência digna, a qual somente poderá ser concretizada caso sejam atendidos os princípios constitucionais que pautam a atividade econômica, dentre os quais a defesa do meio ambiente, nos termos do inciso VI, do artigo 170, verbis:
Artigo 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios:
VI – defesa do meio ambiente, inclusive mediante tratamento diferenciado conforme o impacto ambiental dos produtos e serviços e de seus processos de elaboração e prestação;
O aparente conflito entre esses dois princípios constitucionais (proteção ao meio ambiente e desenvolvimento nacional) deve pautar-se na ponderação, in concreto, de qual deve prevalecer, levando-se em consideração o interesse mais relevante, o que ensejará o menor número de prejudicados e o menor impacto social.
Neste contexto, numa análise conjuntural e sistêmica do texto constitucional, é possível inferir que o próprio Poder Constituinte vislumbrou a possibilidade e necessidade de conciliação desses dois valores — desenvolvimento e meio ambiente — tanto que estabeleceu a defesa do meio ambiente como princípio da ordem econômica, objetivando o que se denomina desenvolvimento sustentável.
Assim, a solução do aparente conflito existente na dispensa de instituição de reserva legal nos imóveis destinados à implantação de empreendimentos de geração, subestações, linhas de transmissão e de distribuição de energia elétrica, deve sopesar o interesse na proteção do meio ambiente com a necessidade de desenvolvimento econômico do país, que perpassa, obrigatoriamente, pelo setor elétrico.
Acrescente-se que a garantia de desenvolvimento sustentável do setor elétrico não possui cunho meramente econômico, o que, todavia, por si só já justificaria a sua importância ao país, mas, principalmente, social.
É inegável que a própria dignidade da pessoa humana, também considerada como princípio fundamental da República Federativa do Brasil, depende do acesso dos cidadãos à energia elétrica para que possam usufruir de um mínimo de conforto, bens indispensáveis, e para que desenvolvam atividades econômicas para seu sustento e crescimento do país.
A importância de se promover o acesso à energia elétrica no país é refletida, por exemplo, no programa do Governo Federal “Luz para Todos”, que procura ser um vetor do desenvolvimento social e econômico das comunidades que sofrem de exclusão energética, contribuindo para a redução da pobreza e aumento da renda familiar.
Todavia, se o desenvolvimento do setor elétrico implica em inevitável alteração do meio ambiente, isso pode ser feito de forma racional, minimizando e compensando eventuais efeitos, para que coexistam os princípios fundamentais de proteção ao meio ambiente e desenvolvimento econômico.
Basta verificar o rigoroso processo de licenciamento ambiental a que se sujeitam os empreendedores, que assumem e executam uma série de medidas mitigadoras e compensatórias para fins de instalação e funcionamento dos empreendimentos. Como é notório, os processos de licenciamento estabelecem programas ambientais considerados indispensáveis à compatibilização dos empreendimentos com a proteção do meio ambiente, mediante o exame dos impactos socioambientais ocasionados.
Conclui-se, assim, que o parágrafo 7º, do artigo 12, da Lei Federal 12.651/2012, é compatível com o princípio constitucional do desenvolvimento sustentável, uma vez que essencialmente vinculado à dignidade da pessoa humana, reconhecida como direito fundamental (artigo 1º, inciso III, Constituição Federal).
Fonte: Conjur

segunda-feira, 20 de janeiro de 2014

"Bomba" leva brasileiros à prisão nos EUA


Uma brincadeira de mau gosto ou um grande mal-entendido pôs dois jovens brasileiros na prisão, quando embarcavam, no último dia 26, de Miami (EUA) para o Brasil. Eles disseram aos agentes do aeroporto que possuíam uma bomba na mala. Um aparato antiterrorismo teve de ser acionado, o que causou pânico no aeroporto.

Apesar de ter sido alarme falso (e, segundo familiares, problema de tradução), o Departamento de Justiça dos EUA diz em nota que os dois podem pegar até cinco anos de prisão e ter que pagar multa de US$ 250 mil por "dar falsa informação de ameaça".

O texto diz que o segurança decidiu fazer inspeção mais rigorosa na bagagem de mão de Mizael Cabral após passar no raio X. Quando o funcionário foi abrir a mala, Cabral disse: "Você já encontrou a bomba na mala?", segundo a nota. O amigo Daniel Correa completou: "Se abrir a mala, ela explodirá", ainda segundo o texto do governo norte-americano.

Em um país que vive sob o medo do terrorismo e às vésperas das eleições presidenciais (ocorridas no dia 2), as palavras foram suficientes para causar uma confusão geral. Seguranças foram chamados, os jovens, de 27 e 29 anos, foram detidos e agentes do esquadrão antibombas, chamados.

"Com o elevado nível de ameaça [terrorista], a segurança de nossos portos de entrada estão em prioridade máxima. Vamos perseguir agressivamente todos que fingirem ou verdadeiramente tentarem ameaçar a segurança", diz, na nota, Marcos Daniel Jiménez, promotor de Justiça da Flórida.

Vocabulário

Os familiares dos jovens procuraram o consulado brasileiro em Miami dois dias depois. Segundo a descrição que fizeram do caso, houve mal-entendido em relação às palavras que eles utilizaram.

Na versão dos familiares, Cabral e Correa trabalham com pranchas de surfe e, na mala, estaria uma bomba de sucção, usada em sua profissão. O termo correto em inglês para o aparelho é "pump". Mas, dizem os familiares, com vocabulário ruim, se enganaram e disseram "bomb", o que significa uma bomba explosiva no idioma.

Segundo o consulado, os jovens voltavam ao Brasil após um período em que moraram com parentes nos EUA. O órgão disse que eles serão ouvidos pela Justiça norte-americana em audiência na próxima quarta. Receberão a acusação e devem se declarar culpados ou inocentes. O juiz decidirá então se dá seguimento ao caso.

O consulado afirmou acompanhar o caso e diz que prestará assistência à família e aos réus.

Fonte: Folha UOL

A carga tributária não é coisa do outro mundo”

“Tudo está nas mãos da União”. A constatação é do advogado tributarista Paulo Barros de Carvalho, considerado um dos tributaristas mais influentes do país. Para o especialista, que foi convidado em 2012 para fazer um diagnóstico das relações tributárias e políticas entre União, Estados e municípios e sugerir soluções para aprimorá-las, junto com outros especialistas, não há solução aparente para o problema envolvendo a queda dos repasses da União para Estados e Municípios e o consequente enfraquecimento dos entes federativos. Em entrevista à TRIBUNA DO NORTE, Paulo Barros explica como o Brasil ‘deixou’ de ser uma República Federativa e por que não acredita mais numa reforma tributária.

Professor da PUC afirma que sistema brasileiro funciona bem e não requer mudanças
Professor da PUC afirma que sistema brasileiro funciona bem e não requer mudanças


Em entrevista concedida há quatro anos, o senhor disse que o sistema tributário brasileiro funcionava bem e que não precisava de reparos. O senhor ainda tem a mesma opinião?
Tenho exatamente esta mesma opinião. Eu entendo que o sistema, como máquina, como estrutura, tem funcionado admiravelmente bem, tanto assim que o governo bate a cada período de apuração os recordes  de períodos anteriores. Quer dizer, o sistema de arrecadação é muito bom, as medidas novas que o governo quer tomar são facilitadas pelo sistema. No Peru, por exemplo, um professor amigo meu se queixava porque a sociedade e o governo queriam um pequeno aumento na carga tributária, mas o sistema travava, não fluía. Tomava-se uma iniciativa e levava-se meses e meses para surtir resultado. Aqui, se for fazer, a providência sai num dia, e dois dias depois está na rua, estão cobrando.

Por que nosso sistema tributário funciona melhor do que o de outros países?
Nosso sistema contempla uma série de situações, há mecanismos para ajustes, reajustes e acomodações. Agora isso não quer dizer que funcione para o bem. Uma coisa é funcionar bem, outra é funcionar para o bem. 


Como assim?
Uma série de valores que estão previstos no texto de 1988 não estão sendo aplicados. A Constituição, por exemplo, estabeleceu a progressividade, que é um fator muito importante da Justiça do imposto. No entanto, o imposto que era progressivo até 1988 deixou de ser, no exato momento que a Constituição mandava que fosse. Eu tenho reclamado bastante disso, dito em todos os congressos.

O modelo que estabelece as atuais faixas de descontas está esgotado?
Eu acho que não corresponde aos anseios de justiça  tributária que o imposto sobre a renda pode oferecer. O imposto de renda pode se um imposto que caminhe para uma tributação justa.

No caso do modeloatual, quem ganha menos acaba pagando mais?
Eu diria que nesse caso, quem não pode deixar de pagar mesmo é o assalariado, que tem sua remuneração monitorada. Ele não pode escapar. Há outros com mais recursos que podem acabar usufruindo, se beneficiando, de incentivos, e isso provoca um certo desequilíbrio em termos de justiça do imposto. 

Na década de 90, Flávio Rocha, empresário potiguar, candidatou-se à Presidência da República com a bandeira do imposto único. Isso ainda é possível?
Não, nunca foi possível, tanto que não houve país que o fizesse. O Brasil tem uma estrutura de estado tão complexa, dividida entre União, Estados e Municípios, todos com autonomia política, legislativa, financeira, ao menos em termos constitucionais. No Brasil, a impossibilidade é total. Isso seria negar tudo, negar toda a estrutura que o Brasil tem. Agora chama a atenção. Lembro que houve passeata, movimento de rua exigindo imposto único. Ele tomou isso como fator político.
  
Uma utopia política...
É. Tanto que não foi levando adiante. Pelo contrário, aumentaram o número de impostos cobrados.

Por falar em utopia política, o senhor acredita que uma reforma tributária é possível? O senhor disse certa vez que falar em reforma tributária era vender ilusão. Algo mudou?
Acho que hoje é mais do que era.

Por qual razão? O fato histórico nos diz o seguinte: estamos falando em reforma tributária desde 1988, quando elaboramos a Constituição, e o que se fez? Absolutamente nada, porque a estrutura financeira do Estado é muito complexa. E depois precisa haver vontade política de todas essas entidades. Imagine uma mesa bem comprida em que numa cabeceira estivesse o representante da União, na outra cabeceira o representante dos contribuintes, ao longo da mesa o representante dos 27 estados, incluindo o Distrito Federal, mais os representantes dos mais de 5 mil municípios, que não podiam estar de fora. Veja que reunião complicada. Podemos imaginar uma mesa comprida e todos discutindo essa questão. Nós sabemos das disputas regionais, intermunicipais, da União com os Estados, com os Municípios e isso torna impossível um acordo. Veja a guerra fiscal. Não se consegue dar jeito na guerra fiscal. E para estabelecer uma reforma tributária constitucional é necessário um grande acordo com todos participando. Mas a União não tem interesse nenhum.

Mas por quê?
A União sempre arrecada muito dinheiro. Recebe inclusive contribuições que não precisam repassar para Estados e Municípios. Ela é dona do cofre público, então, se está ganhando, vai reformular para quê? Todos os Estados e todos os Municípios do Brasil são devedores da União. A União absorveu em um determinado momento todas as dívidas que os Estados e Municípios tinham com outros credores. E ficou ela só. O que isso representa? Uma ajuda da União? Não. Significa que a União agora tem todos os Estados e Municípios na mão. Quem vai brigar com o credor? Sem falar que as condições são extremamente desfavoráveis aos Estados e Municípios devido ao momento histórico em que eles se encontravam quando as dívidas passaram para a União, com juros altíssimos etc. Há dívidas que são consideradas impagáveis, como por exemplo a de São Paulo, cidade mais rica do país. São Paulo é a que mais deve. A presidente Dilma está tentando junto ao prefeito encontrar uma solução para tornar uma dívida pagável. Quando a dívida se torna pagável, o devedor volta para as mãos do credor. Em função disso, a União não tem interesse que saia a reforma tributária. O fato histórico mostra que o processo está parado.

Existe uma corrente que acredita que reforma tributária significa baixar impostos; outra diz o inverso. E o senhor? 
Olha, eu acho que não devemos pensar no aumento dos impostos. A carga tributária do país está numa posição bem cômoda na lista dos países tributaristas. Não é nada do outro mundo. Há muitos países com carga tributária maior. Alguns dizem ‘essa carga tributária está sufocando a economia’. Como é que o Brasil cresceu 7% no ano de 2010 com a mesma carga tributária? Como é que se explica então? Isso significa que pode haver crescimento com essa carga tributária.

Então, a carga tributária  de hojenão tem grande efeito no Custo Brasil?
Tem efeito, mas não tem um grande efeito. Eu creio que o Custo Brasil esteja representado mais pela infraestrutura. Realmente não dá para ter competitividade sem portos, estradas, aeroportos, malha ferroviária, que inexplicavelmente o Brasil não tem. Outros países têm. Os interesses econômicos são muito fortes....

A Associação Comercial de São Paulo o criou o ‘impostômetro’, já os procuradores da Fazenda Federal o ‘sonegômetro’. Terminamos 2013 com R$ 1 trilhão de impostos arrecadados e R$ 500 bilhões sonegados, segundo as estimativas deles. Há condições de um país seguir em frente dessa forma?
Risos. Isso já dizia o doutor Osíris de Azevedo Lopes Filho, quando era secretário da Receita Federal. Ele dizia que a cada real pago um era sonegado. Eu não sei a proporção exata, mas existe realmente uma economia informal, forte no Brasil ainda, e uma economia formal, com várias dificuldades com relação ao cumprimento. Há pessoas que querem pagar imposto, mas esbarram numa série de dificuldades. A complexidade é muito alta e isso diminui o valor arrecadado. De modo que pessoas muito bem estruturadas procuraram meios para diminuir a sua carga tributária.

O Governo Federal adotou algumas estratégias para estimular o setor automotivo, entre elas, a redução do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI). Os prefeitos reclamam que isso tem reduzido os repasses do Governo Federal para os municípios. Não existe outra maneira de fazer isso?
Existe, mas essa é a maneira que dá repercussão política, que aparece, então a presidente baixando uma medida como essa agrada algumas pessoas. Agora que prejudica os líderes dos Municípios prejudica porque diminui os repasses que a União faz. O governo federal ficou tão forte, tão forte, tão forte, que nós vivemos hoje um Estado unitário, onde está tudo nas mãos da União. A União foi se fortalecendo, em termos econômicos, em termos políticos, e em termos jurídicos também. O Brasil se tornou um Estado unitário, não uma República federativa, porque uma federação pressupõe uma igualdade entre as pessoas políticas. Todos no mesmo pé de igualdade. Onde existe isso no Brasil? 

Somos uma República federativa só no papel?
Na Constituição está que  somos uma República federativa e isso não existe. O que existe é um Estado unitário como existia na época do império e que trouxe uma série de dificuldades, porque era difícil levar o desenvolvimento até as regiões longínquas. Aí se instaurou a federação, porque se descentralizava o poder, a decisão e inclusive o desenvolvimento e que a forma que mais atende os anseios democráticos. 

Uma ditadura econômica?
A União tem uma força econômica, política e jurídica muito superior a dos Estados e Municípios. Que ela tira proveito disso. Veja: eu estava em Belo Horizonte e veio a notícia de que a presidente Dilma foi visitar uma cidade no interior de Minas Gerais e deu uma verba imensa para pavimentar a cidade. E depois foi para outra e deu uma verba para que a cidade restaurasse de oito a dez igrejas histórias. É bom? É. É excelente? É, do ponto de vista histórico. Agora  é o governo federal com sua força unitária distribuindo as benesses do jeito que lhe convém. Agora, é claro, que a União não dará para adversários políticos. Tenho certeza disso. Ela vai dar para os aliados. E assim vai.

Diante da queda dos repasses os prefeitos dizem que os municípios caminham para a insolvência. Eles estão exagerando?
Não. Não estão exagerando. Isso eu posso dizer, porque participei da comissão do Pacto Federativo, que o presidente do Senado, na época Sarney, convidou administradores, economistas, ministros e pesquisadores notáveis, para estudar os problemas da federação, e foi nesse contexto que eu vi como os Estados e Municípios estão enfraquecidos. Estados e Municípios decidem muito pouco, porque está tudo nas mãos da União. 


* Paulo de Barros Carvalho é professor Titular na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC-SP, onde leciona desde 1971 nos cursos de Bacharelado, Especialização, Mestrado e Doutorado e coordenador do Programa de Pós Graduação em Direito da PUC-SP, desde 1993. Professor Titular na Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo e presidente do Instituto Brasileiro de Estudos Tributários.

segunda-feira, 13 de janeiro de 2014

Bolsas de estudo para mestrado em "Cooperação Internacional" na Espanha

A Fundação Carolina oferece 4 bolsa de estudo para mestrado em "Cooperação Internacional" na Espanha, na Universidad de Cantabria.

Mais informações no site da Fundação Carolina.

sábado, 11 de janeiro de 2014

Mujica, teórico da transição pós-capitalista?

Em entrevista inédita no Brasil, presidente uruguaio debate causas do fracasso do “socialismo real” e afirma: para superar sistema, é preciso começar pelo choque de valores
Cada vez mais popular tanto nas redes sociais como na mídia tradicional, o presidente do Uruguai, Pepe Mujica, arrisca-se a sofrer um processo de diluição de imagem semelhante ao que atingiu Nelson Mandela. Aos poucos, cultua-se o mito, esvaziado de sentidos — e se esquecem suas ideias e batalhas. Por isso, vale ler o diálogo que Pepe manteve, no final do ano passado, com o jornalista catalão Antoni Traveria. Publicada no site argentino El Puercoespínentrevista revela um presidente que vai muito além do simpático bonachão que despreza cerimônias e luxos.
Mujica, que viveu a luta armada e compartilhou os projetos da esquerda leninista, parece um crítico arguto das experiências socialistas do século XX. Coloca em xeque, em especial, uma crença trágica que marcou a União Soviética e os países que nela se inspiraram: a ideia de que o essencial, para construir uma nova sociedade, era alterar as bases materiais da produção de riquezas. ”Não se constrói socialismo com pedreiros, capatazes e mestres de obra capitalistas”, ironiza o presidente. Não se trata de uma constatação lastimosa sobre o passado ou de um desalento. Mujica mantém-se convicto de que o sistema em que estamos mergulhados precisa e pode ser superado. Mas será um processo lento, como toda a mudança de mentalidades, e precisa priorizar o choque de valores: tornar cada vez mais clara a mediocridade da vida burguesa e apontar modos alternativos de convívio e produção. Leia a seguir, alguns dos trechos centrais da entrevista:
Fonte: Outras Palavras
“A batalha agora é muito mais longa. As mudanças materiais, as relações de propriedade, nem sequer são o mais importante. O fundamental são as mudanças culturais e estas transformações exigem muitíssimo tempo. Mesmo nós, que não podemos aceitar filosoficamente o capitalismo, estamos cercados de capitalismo em todos os usos e costumes de nossas vidas, de nossas sociedades. Ninguém escapa à densa malha do mercado, a sua tirania. Estamos em luta pela igualdade e para amortecer por todos os meios as vergonhas sociais. Temos que aplicar políticas fiscais que ajudem a repartir — ainda que seja uma parte do excedente — em favor dos desfavorecidos. Os setores proprietários dizem que não se deve dar o peixe, mas ensinar as pessoas a pescar; mas quando destroçamos seu barco, roubamos sua vara e tiramos seus anzóis, é preciso começar dando-lhes o peixe”.
“A vida é muito bela e é preciso procurar fazer as coisas enquanto a sociedade real funciona, ainda que seja capitalista. Tenho que cobrar impostos para mitigar as enormes dificuldades sociais; ao mesmo tempo, não posso cair no conformismo crônico de pensar que reformando o capitalismo vou a algum lado. Não podemos substituir as forças produtivas da noite para o dia, nem em dez anos. São processos que precisam de coparticipação e inteligência. Ao mesmo tempo em que lutamos para transformar o futuro, é preciso fazer funcionar o velho, porque as pessoas têm de viver. É uma equação difícil. O desafio é bravo. Há quem siga com o mesmo que dizíamos nos anos 1950. Não se deram conta do que ocorreu no mundo e por quê ocorreu. Sinto como minhas as derrotas do movimento socialista. Me ensinam o que não devo fazer. Mas isso não significa que vá engolir a pastilha do capitalismo, nesta altura de minha vida”.
“Não sei se vão me dar bola, mas digo aos jovens de hoje que aprendemos mais com o fracasso e a dor que com a bonança. Na vida pessoal e na coletiva pode-se cair uma, duas, muitas vezes, mas a questão é voltar a começar. E é preciso criar mundos de felicidade com poucas coisas, com sobriedade. Refiro-me a viver com bagagem leve, a não viver escravizado pela renovação consumista permanente que é uma febre e obriga a trabalhar, trabalhar e trabalhar para pagar contas que nunca terminam. Não se trata de uma apologia da pobreza, mas de um elogio à sobriedade — não quero usar a palavra austeridade, porque na Europa está sendo muito prostituída, quando se deixa as pessoas sem trabalho em nome do ‘austero’”.
“Em toda a história do Uruguai, o presidente repartia as licenças de rádio e TV com o dedo. Tivemos a ideia de abrir consultas e processos democráticos baseados em méritos. Pensamos e realizamos! O que certa imprensa diga não me preocupa. Já os conheço. O problema que o diário [uruguaio] El País pode me criticar e se, algum dia, estiver de acordo e me elogiar. Seria sinal de que ando mal”.
[Para ler, na íntegra (em castelhano) a entrevista com Pepe Mujica, clique aqui]

quinta-feira, 9 de janeiro de 2014

Comprar imóvel na Espanha dá direito a visto

De olho em investidores estrangeiros, a Espanha autorizou, por lei, o direito a visto de residência para compradores de imóveis com valor superior a 500 mil euros (R$ 1,5 milhão). O objetivo da Lei 14\2013 de Apoio ao Empreendedorismo e Internacionalização, instituída em setembro deste ano, é ajudar o país a se recuperar da forte crise em que está mergulhado.
A bolha imobiliária no país teve início quando os espanhóis passaram a comprar imóveis financiados pelos bancos e não conseguiram pagar as dívidas. Os imóveis foram então retomados pelo sistema financeiro e agora estão sendo vendidos.
Segundo a especialista em Direito Societário e Mercado de Capitais, Fusões e Aquisições da Abe Advogados, Marina Maranhão, para obter o visto, inicialmente por um ano, é preciso apresentar a matrícula registrada do imóvel. “Não basta apenas um contrato de compra e venda”, observa. O visto, que dá possibilidade ao estrangeiro de trabalhar e estudar no País, pode ser renovado por mais dois anos, desde que o anterior não tenha vencido há mais de 90 dias e que o proprietário tenha mantido o imóvel e viajado ao menos uma vez para a Espanha no período. Após o vencimento no terceiro ano, há ainda a possibilidade de uma nova renovação de dois anos. Com cinco anos de residência, a legislação espanhola permite que o estrangeiro requeira a nacionalidade, que será analisada caso a caso.
Redução dos preços
Há uma notável redução nos preços dos imóveis espanhóis. Em uma das principais avenidas de Barcelona, a Gran de Grácia, um imóvel com 260 metros quadrados, que custava 975 mil euros (cerca de R$ 3 milhões), passou a custar 790 mil (R$ 2,4 milhões) nos últimos meses. Os destinos mais procurados são os turísticos, como as regiões de Málaga, Alicante e Barcelona. Muitos brasileiros estão adquirindo casas de férias para alugá-las. “Além disso, alguns investidores pretendem comprar agora para vender daqui um ano, por exemplo. Ainda é arriscado, pois não sabemos como a economia espanhola estará futuramente”, aconselha.

Marina também lembra que é preciso ter cuidado na hora de comprar os imóveis, pois muitos deles podem ainda ter pendências judiciais, por conta dos despejos realizados na crise, que precisam ser resolvidas antes da compra. “A medida do governo visa justamente a fomentar a venda da inúmera quantidade de imóveis que foram objeto de despejo por bancos e construtoras, pois a população espanhola ainda não está apta financeiramente a adquirir esses imóveis”, explica.
Segundo informe do Conselho Geral do Notariado, órgão que rege os cartórios espanhóis, a aquisição de imóveis por estrangeiros não residentes já havia crescido 43% no segundo trimestre de 2013, comparado ao mesmo período de 2012. “Esse aumento se deu por conta dos preços que começaram a diminuir. O visto é um adicional que tende a aumentar ainda mais as aquisições”, ressalta Marina.
Fonte: Terra

Bolsas de estudo Victor Hugo para mestrado ou doutorado na França

UFC (Universidade de Franco-Condado) está com as inscrições abertas para o Programa Victor Hugo, uma iniciativa que vai oferecer bolsas de estudo para mestrado ou doutorado na França. 

Prazo de inscrições vai até 17 de janeiro.

Fonte: Universia

sexta-feira, 3 de janeiro de 2014

A sham litigation no âmbito do Poder Judiciário e a atuação do Cade na vigência da lei 12.529/11

O presente artigo versa sobre um tema atual, mas ainda pouco discutido em nosso país: aSham Litigation. Tema já conhecido e recorrente nos Estados Unidos, a doutrina da sham litigation vem sendo conhecida e desenvolvida aos poucos no Brasil. Atualmente, dentre a pouca “doutrina” existente no nosso vernáculo estão as decisões proferidas pelo Cade que vem guiando as pesquisas a respeito deste tema.
O tema do presente artigo vem despertando o interesse de acadêmicos e docentes, por ser recente no campo do Direito Econômico. Muitas pesquisas vêm abordando este tema relacionando-o com outros ramos do Direito, notadamente o Direito Constitucional, Processual Civil e a hermenêutica jurídica.
A sham litigation é uma conduta. É o ato de se valer do Poder Judiciário para ajuizar ações sem que haja qualquer perspectiva de sucesso. O que há, na verdade, é uma finalidade oculta, camuflada, de causar um prejuízo a um concorrente direto visando atingi-lo negativamente, de forma que ele enfrente dificuldades financeiras, estruturais e de reputação.
Interessante perceber que a própria tradução livre do termo sham litigation do inglês para o português nos permite compreender que se trata de uma forma fraudulenta de acessar o judiciário. É a utilização dissimulada do Direito de Ação por aquele que, dotado de interesses obscuros, tem o objetivo único de prejudicar seu concorrente direto.
Para a caracterização da sham litigation é conditio sine qua non que a pretensão de quem a pratica seja totalmente destituída de fundamentação jurídica e que a demanda judicial tenha, ao menos, o potencial de trazer um prejuízo à ordem econômica e/ou à concorrência.
O conceito desham litigation para o Conselheiro do Cade, Dr. César Costa Alves Mattos seria:
[...] a conduta consubstanciada no exercício abusivo do direito de petição, com a finalidade de impor prejuízos ao ambiente concorrencial. Ou, em outras palavras, sham litigation é a litigância predatória ou fraudulenta com efeitos anticompetitivos, ou seja, o uso impróprio das instâncias judiciárias e dos processos governamentais adjudicantes contra rivais para alcançar efeitos anticompetitivos (BRASIL, 2010, p. 3754).
Para o professor Felipe Mascarenhas Tavares, sham litigation diz respeito a uma ação “promovida no âmbito do Poder Judiciário que careça de bases objetivas e fundamentadas e de expectativa plausível e razoável de sucesso, com a finalidade disfarçada de prejudicar concorrente direto.” (TAVARES, 2011, p. 1).
E o professor Felipe Tavares continua:
[...] também se refere ao abuso do direito de petição ao Poder Executivo e Legislativo. A tradução “litigância simulada” enfatiza a compreensão de utilização de camuflagem processual pelo competidor de má-fé, uma vez que é primordial para a caracterização da conduta que a tutela estatal seja invocada com a finalidade deliberada de prejudicar a concorrência. Sem esse último quesito comprovado não há como falar em sham litigation. Assim, a invocação da autoridade estatal ocorre de forma disfarçada, simulando uma situação para ocultar o fim almejado de prejudicar a concorrência (TAVARES, 2011, p. 1).
A Professora Shirlei Silmara de Freitas Mello, em sua publicação sobre processos administrativos sancionadores discorre sobre a sham litigation abordando aspectos relevantes:
Sham significa imitação, réplica, falsa amostra; engodo, farsa; fingimento; falsidade, leviandade. O instituto do sham litigation ou abuso do direito de petição desenvolveu-se de forma expressiva nos Estados Unidos, como ressalva à aplicação da doutrinaNoerr-Pennington.[...] Além das definições legais próprias de litigância temerária, há considerável divergência acerca da freqüência de tais impugnações movimentando juízos e outras instâncias decisórias, tais a administrativa, e as implicações para o bem estar social das várias opções políticas desenvolvidas para limitar tal atuação. Alguns juristas acreditam que SL é um fenômeno substancial e crescente nos EUA e que ela representa um desafio para a atual política antitruste. Outros concebem a temática antitruste com mais simplicidade, encarando os problemas e dificuldades conjuntamente com as respectivas soluções: uma restrição dos direitos de acesso à justiça postos na Primeira Emenda. Definições judiciais de SL apresentam-se discrepantes: Juiz Posner aplicou abordagem custo-benefício (razoabilidade e proporcionalidade) para analisar intenção anticompetitiva e sustentou que, mesmo pretensões não manifestamente infundadas, ou seja, possivelmente fundadas, podem constituir SL. (MELLO, 2010, p. 4).
Desta feita, a sham litigation se configura mediante a existência de dois requisitos: o abuso do direito de ação e o interesse de prejudicar um concorrente direto. (BRASIL, 2010, p. 3755).
Estes dois requisitos foram determinados pela Suprema Corte Norte-Americana no emblemático caso Professional Real Estate Investors, Inc. vs. Columbia Pictures Industries, Inc. A Professora Shirlei Mello, comentando sobre o caso e sobre a criação dos requisitos para a configuração da sham litigation expõe que:
A partir de sucessivos julgamentos, a Suprema Corte dos Estados Unidos buscou delimitar requisitos necessários para configurar sham litigation. No julgamento do caso Professional Real Estate Investors, Inc. v. Columbia Pictures Industries, Inc. (508 U.S. 49, 113 S.Ct. 1920) foram estabelecidos dois critérios para sua caracterização: (i) a ação deve ser desprovida de qualquer fundamento, não sendo realista por parte do litigante qualquer expectativa de vitória quanto ao mérito e (ii) tal ação sem fundamento constitua meio fraudulento para esconder “tentativa de interferir diretamente com as relações empresariais do concorrente.” (MELLO, 2010, p. 4).
Referido caso determinou, portanto, o surgimento de uma espécie de “teste” para se apurar quando a litigância perante o Estado seria, na verdade, uma farsa. (TAVARES, 2011, p. 3). Na obra Anticompetitive Litigation and Antitrust Liability, fazendo uma análise sobre este “teste” – que nada mais é do que a apuração dos requisitos para se caracterizar a sham litigation – o professor norte-americano, Dr. Christopher C. Klein, analisou os dois requisitos para a caracterização da Sham Litigation. Traduzindo um trecho do estudo de Klein, o Conselheiro César Mattos, em um de seus votos proferidos no Conselho do Cade, valeu-se da mencionada obra para abordar sobre a caracterização daSham Litigation. Assim, verificamos que Klein expõe que a sham litigation se caracteriza quando presentes dois requisitos:
Primeiro, se a ação é desprovida de base objetiva, de modo que nenhum litigante razoável poderia, de fato, ter expectativas de ser bem sucedido em seu mérito. Segundo, cumulativo com o primeiro, se o litigante espera influir nos negócios da(s) empresa(s) concorrente(s) tão somente através do processo em si mesmo, ao invés de buscar sua satisfação no resultado do processo. (KLEIN, 2007).
Assim, não há que se falar em sham litigation se, por exemplo, uma empresa demandar contra a sua concorrente direta visando atingi-la financeiramente (requerendo a aplicação de uma multa ambiental, por exemplo) se ela possuir razões legais e provas lícitas que ensejem a propositura desta demanda. Neste caso, mesmo que haja a clara intenção de causar um prejuízo a um concorrente direto, não há que se falar em abuso do Direito de Ação, pois, municiada de provas e embasada na legislação pátria, a empresa demandante apenas se valeu do Direito de Ação que lhe é garantido pela Constituição Federal para demandar judicialmente.
Diferente é o cenário se uma empresa ajuizar uma ação contra uma concorrente direta requerendo a aplicação de uma multa de altíssimo valor – que poderia comprometer seriamente o funcionamento desta empresa – alegando falsamente que sua concorrente vem descumprindo normas ambientais. Neste caso estaria perfeitamente configurada aSham Litigation, pois o exercício do Direito de Ação foi deturpado para ser utilizado como meio de prejudicar um concorrente direto.
Nesse exato sentido já se manifestou o Conselheiro Olavo Chinaglia em voto proferido no Conselho do Cade. Vejamos:
Em outras palavras, uma ação ajuizada de forma regular e em observância aos princípios processuais não poderá jamais ser considerada uma infração à ordem econômica, ainda que se avalie que a decisão obtida tenha trazido impactos negativos aos concorrentes e ao mercado.
[...]
O que é juridicamente inaceitável, e aqui reside o sinal distintivo da predação judicial, é que os esforços do autor da ação estejam voltados não para vencer o concorrente no mérito do feito, mas para derrota-lo ou prejudica-lo na arena dos negócios por meio dos danos colaterais advindos da própria existência do processo.
Evidente que nem toda acusação de abuso de direito de litigar desperta interesse da repressão antitruste. Para tanto, deve ficar demonstrado, adicionalmente, que os efeitos – ainda que potenciais – da condita investigada não ficaram restritos a um agente econômico, Os prejuízos a particulares impostos pela litigância abusiva podem justificar uma reparação no âmbito cível, mas a configuração de um ilícito antitruste punível pelo CADE depende da comprovação de um prejuízo à própria ordem concorrencial. (BRASIL, 2010, p. 3695).
Cumpre destacar, no entanto, que se trata de um longo e árduo percurso até que se conclua irrefutavelmente que uma conduta está caracterizada como Sham Litigation. Muito embora o requisito do abuso do direito seja objetivo, o requisito relacionado à intenção de causar prejuízo a um concorrente direto é subjetivo e “somente serão consideradas infrações anticoncorrenciais os atos que tenham potencial para produzir tais efeitos.”(BRASIL, 2010, p. 3764).
Assim, conclui-se que a sham litigation trata-se de uma conduta ainda pouco praticada em nosso país se compararmos com a altíssima incidência de sham litigation nos Estado Unidos, por exemplo. Entretanto, necessário que o Estado se posicione de maneira firme e contundente para inibir que esta conduta ardilosa se dissemine.
Um importante passo que foi dado é a nova redação da lei antitruste (12.529/11) que conferiu amplos poderes investigativos e de julgamento de condutas anticoncorrenciais ao CADE. Referida lei demonstra os avanços do ordenamento jurídico pátrio na tentativa de barrar o crescimento das infrações econômicas.
Por: Caio Neves Romero
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Referências
Brasil. Lei 12.529, de 01 de Novembro de 2011. Estrutura o Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência; dispõe sobre a prevenção e repressão às infrações contra a ordem econômica; altera a Lei no 8.137, de 27 de dezembro de 1990, o Decreto-Lei no 3.689, de 3 de outubro de 1941 - Código de Processo Penal, e a Lei no 7.347, de 24 de julho de 1985; revoga dispositivos da Lei no 8.884, de 11 de junho de 1994, e a Lei no 9.781, de 19 de janeiro de 1999; e dá outras providências. 14. ed. São Paulo: Editora Rideel, 2012.
Brasil, Conselho Administrativo de Defesa Econômica, Processo Administrativo nº 08012.004484/2005-51, Conselheiro Relator Fernando de Magalhães Furlan, 2010.
Figueiredo, Leonardo Vizeu. Lições de Direito Econômico. 5. ed. Rio de Janeiro: Editora Forense, 2012. p. 220-221 e 269-270.
Klein, Christopher C. Anticompetitive Litigation and Antitrust Liability. Middle Tennesse State University. DEPARTAMENT OF ECONOMICS AND FINANCE WORKING PAPER SERIES: 2007.
Mello, Shirlei Silmara de Freitas. Processo administrativo sancionador federal como instrumento de proteção de direitos individuais e difusos: Breves reflexões sobre o garantismo e interesse público na efetivação da pretensão punitiva estatal. Disponível em: Acesso em 22/05/13.
Tavares, Felipe Mascarenhas. Sham Litigation: abuso do direito de ação. Atos de má-fé e sua vantagem indevida. Disponível em: Acesso em 22/05/13.
Fonte: Migalhas