quinta-feira, 13 de dezembro de 2018

Artigo 2: Liberdade de viver sem discriminação - DUDH


Artigo 2: Todo ser humano tem capacidade para gozar dos direitos e das liberdades estabelecidos nesta Declaração, sem distinção de qualquer espécie, seja de raça, cor, sexo, idioma, religião, opinião política ou de outra natureza, origem nacional ou social, posição econômica, nascimento ou qualquer outra condição.

Não será também feita nenhuma distinção fundada na condição política, jurídica ou internacional do país ou território a que pertença uma pessoa, quer se trate de um território independente, sob tutela, sem governo próprio, quer sujeito a qualquer outra limitação de soberania. 
O Artigo 2 estabelece que todos têm direito a todas as liberdades listadas na DUDH, “sem distinção de qualquer espécie, seja de raça, cor, sexo, idioma, religião, opinião política ou de outra natureza, origem nacional ou social, posição econômica, nascimento ou qualquer outra condição”. As últimas palavras desta frase — “qualquer outra condição” — têm sido frequentemente citadas para expandir a lista de pessoas especificamente protegidas.
Esta linguagem está refletida em instrumentos regionais, como a Carta Africana dos Direitos Humanos e dos Povos, a Convenção Americana sobre Direitos Humanos e a Convenção Europeia para a Proteção dos Direitos Humanos e Liberdades Fundamentais. A ONU elaborou direitos em vários tratados que se baseiam no Artigo 2 — incluindo, mais recentemente, a Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, que foi adotada em 2006. Também é fundamental para os atuais esforços de proteger todos os grupos que enfrentam perseguição, mesmo aqueles que não são especificamente cobertos por uma convenção internacional específica.
Na sociedade indiana socialmente conservadora, o engenheiro de Tecnologia da Informação (TI) Akhilesh Godi sentia que mal existia. Deprimido e lutando com questionamentos sobre sua sexualidade, ele estava com medo de procurar ajuda porque achava que até mesmo um terapeuta iria rotulá-lo de criminoso sob as leis indianas contra a homossexualidade. Outros homossexuais e transexuais na Índia disseram ter enfrentado severa discriminação ou chantagem por causa de uma proibição de sexo gay de 157 anos.
Godi decidiu reagir. Ele foi um dos 20 estudantes abertamente gays e ex-alunos de várias escolas de tecnologia — incluindo duas mulheres e uma mulher transgênero — a vencer uma decisão da Suprema Corte da Índia em setembro de 2018, derrubando a lei da era colonial. Os juízes não apenas descriminalizaram o sexo gay. Eles decidiram que, a partir de agora, os indianos gays devem receber todas as proteções da Constituição. A decisão foi bem recebida pela ONU, que disse que “a orientação sexual e a expressão de gênero são parte integrante da identidade de um indivíduo em todo o mundo”.
Quando a Declaração Universal dos Direitos Humanos (DUDH) foi elaborada há 70 anos, pode não ter havido muitos que concordaram. Mas a proibição do Artigo 2 referente à discriminação — e sua afirmação mais positiva de que os direitos humanos pertencem a todos — tem sido a base para a definição de direitos relativos a idade, deficiência e outros assuntos que não foram abordados em 1948.
Na ocasião, o delegado chileno Hernan Santa Cruz lembrou seus colegas de que o Artigo 2 ampliava de maneira importante as disposições básicas da Carta da ONU e comentou que “as Nações Unidas foram fundadas principalmente para combater a discriminação no mundo”. O bloco comunista pressionou fortemente, desde o início, pela adoção de uma linguagem clara contra a discriminação.
Os três primeiros artigos da Declaração estão intimamente interligados. Peng-chung Chang, um desenhista chinês com um notável conhecimento da filosofia oriental e ocidental, propôs que os três primeiros artigos deveriam refletir as principais ideias da filosofia política do século 18 sobre direitos: “fraternidade” (Artigo 1), “igualdade” (Artigo 2) e “liberdade” (Artigo 3). Os Artigos 1 e 2 estabelecem o tom de toda a Declaração com suas proibições de discriminação.
Ambos os artigos continuam a ter influência sobre padrões internacionais novos e em evolução. Em 2006, a ex-chefe de direitos humanos da ONU Louise Arbour observou como a Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência enfatizou que “a celebração da diversidade e o empoderamento do indivíduo são mensagens essenciais de direitos humanos”, acrescentando que tal documento considera que as pessoas com deficiência têm papel ativo na sociedade.
Esta Convenção foi elaborada com a participação de pessoas com deficiência, afastando-se de um modelo mais antigo de ter normas feitas sem a participação das pessoas afetadas por elas.
Embora a proteção fundamentada na DUDH e garantida em outros tratados de direitos humanos deva ser aplicada a todos, as pessoas com deficiência ainda são invisibilizadas — sem possibilidades de usufruir de toda a gama de direitos humanos.
Um número desproporcional de pessoas com deficiência vive em países em desenvolvimento, muitas vezes marginalizados e na extrema pobreza, um fato que esta Convenção pretende mudar, para garantir que as pessoas com deficiência gozem, de fato, de mesmos direitos e dignidade de todos os demais.
Essa abordagem baseada em direitos também foi adotada para os povos indígenas e por aqueles que tentam acabar com a discriminação baseada em orientação sexual e identidade de gênero. A própria ONU está promovendo o respeito aos direitos das pessoas lésbicas, gays, bissexuais e transgêneros (LGBT) de todas as idades e em todas as regiões do mundo.
Não é necessário criar um novo conjunto de direitos específicos para as pessoas LGBT ou definir novos padrões internacionais de direitos humanos. Tudo o que é necessário para proteger as pessoas LGBT da violência e da discriminação é o respeito pelos direitos existentes.
Existem 71 países e territórios, principalmente na África, no Oriente Médio e em partes do sul da Ásia, onde as relações consensuais entre pessoas do mesmo sexo ainda são criminalizadas, incluindo oito onde a homossexualidade pode resultar na pena de morte.

O ex-secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon, admitiu que a orientação sexual e a identidade de gênero são questões compreensivelmente sensíveis para alguns. “Como muitos da minha geração, eu não cresci falando sobre essas questões”, disse ele ao Conselho de Direitos Humanos, em 2012. “Mas aprendi a falar, porque vidas estão em risco e porque é nosso dever sob a Carta das Nações Unidas e sob a Declaração Universal dos Direitos Humanos proteger os direitos de todos, em todos os lugares”.



Fonte: ONUBrasil


terça-feira, 11 de dezembro de 2018

Artigo 1: Todos os seres humanos nascem livres e iguais - DUDH

A Declaração Universal dos Direitos Humanos (DUDH) foi adotada em 10 de dezembro de 1948. Para marcar o aniversário de 70 anos, será publicado textos informativos sobre cada um de seus artigos. A série, disponibilizada pelo Escritório do Alto Comissariado da ONU para os Direitos Humanos (ACNUDH), mostra até onde chegamos, até onde devemos ir e o que fazer para honrar aqueles que ajudaram a dar vida a tais aspirações.

Chefe da Comissão para os Direitos Humanos, Eleanor Roosevelt (direita),
com Hansa Mehta, representante da Índia, em 1º de junho de 1949. Foto: ONU/Marvin Bolotsky

Artigo 1: Todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e direitos. São dotados de razão e consciência e devem agir em relação uns aos outros com espírito de fraternidade.

A Declaração Universal dos Direitos Humanos (DUDH), de 1948, é – obviamente – um documento sobre direitos humanos. Então, por que dignidade é citada antes de direitos no Artigo 1?

A dignidade é a base de todos os direitos humanos. Seres humanos possuem direitos, e devem ser tratados com a mais elevada proteção, precisamente porque cada um possui valor intrínseco. O ex-chefe de direitos humanos da ONU Zeid Ra’ad Al Hussein chamou estas palavras iniciais de “talvez, as mais ressonantes e bonitas de todos os acordos internacionais”. Elas destacam que “direitos humanos não são uma recompensa para bom comportamento”, disse ele, mas o direito de todas as pessoas, em todos os momentos, em todos os lugares.
Reagindo ao horror das duas Guerras Mundiais, a comunidade internacional julgou importante em 1948 enfatizar o conceito de dignidade humana nas primeiras palavras deste documento pioneiro, destacando um termo que já havia sido enfatizado na linha inicial do Preâmbulo da DUDH, assim como na Carta que fundou as Nações Unidas, três anos antes. 
Mary Robinson, outra ex-chefe de direitos humanos da ONU, considerou dignidade como um “senso interior de consciência própria”, um conceito que “evoca uma empatia com o outro, nos conecta uns com os outros”. Isto forneceu um ponto de partida para novas interpretações dos direitos humanos. Como disse Robinson, “em nosso mundo interconectado, esta empatia deve se expandir para atacar as flagrantes desigualdades que levantam questões de justiça”.
Dignidade (uma palavra que aparece cinco vezes ao longo da Declaração) é de um lado um argumento irrefutável, e de outro um conceito ambíguo, nem sempre fácil de ser traduzido para legislação. Mesmo assim, dignidade agora é reconhecida como um direito em mais de 160 Constituições no mundo (de 193 membros da ONU), comparado aos somente cinco países que usavam o termo em suas Constituições em 1945.
E frequentemente cabe aos juízes garantir que a dignidade humana seja respeitada. Juízes como Albie Sachs, que dedicou sua vida a garantir, e então proteger, a dignidade humana. Como um ativista sul-africano antiapartheid, ele passou meses em prisão solitária e perdeu um braço e a visão em um olho quando seu carro foi explodido por agentes de segurança.
Mais tarde, ele ocupou por 15 anos o cargo de juiz do mais alto tribunal da África do Sul. Ele escreveu que chorou após decidir que a companhia aérea South African Airways não poderia discriminar uma comissária de bordo com HIV. “As lágrimas caíram por conta de um grande senso de orgulho de ser membro de um tribunal que protegia direitos fundamentais e assegurava dignidade para todos”, disse.
Assegurar a dignidade para todos está no coração de uma campanha da ONU que se baseia nas primeiras palavras do Artigo 1. “Livres e Iguais” é o slogan para a campanha da ONU contra a homofobia e a transfobia, que começou em 2013 e busca “construir um mundo onde ninguém precise ter medo de sua orientação sexual ou identidade de gênero”, segundo o secretário-geral da ONU, António Guterres.
Gênero é um conceito que é – possivelmente sutilmente – abordado no Artigo 1, e de fato em quase todos os artigos da DUDH. Para sua época, o documento é notavelmente ausente de linguagem sexista. Com a exceção de uma única frase em inglês “himself and his family” (ele próprio e sua família), que aparece nos Artigos 23 e 25, o documento se refere a “todos” ou “ninguém”.
Este uso pioneiro reflete o fato de que mulheres tiveram uma função importante na elaboração da DUDH, pela primeira vez na história da criação internacional de leis. O processo foi comandado por Eleanor Roosevelt, ex-primeira-dama dos Estados Unidos e defensora dos direitos humanos. Mulheres de Dinamarca, Paquistão, do bloco comunista e de outras nações não ocidentais também fizeram contribuições cruciais.
As primeiras palavras do Artigo 1 ecoam a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, documento francês adotado pouco após a revolução francesa, em 1789. Graças à firme redatora indiana Hansa Mehta, a frase francesa “todos os homens nascem livres e iguais” se tornou “todos os seres humanos nascem livres e iguais”.
Ela se opôs à afirmação de Roosevelt de que “homens” incluíam as mulheres – um conceito amplamente aceito na época. Mehta argumentou que países poderiam usar esta formulação para restringir os direitos das mulheres, em vez de expandi-los.
As mulheres redatoras da DUDH criaram um legado duradouro – mesmo em um mundo onde grande parte do trabalho ainda precisa ser feita. Em quase todos os países, mulheres continuam ganhando menos que homens. Práticas discriminatórias contra mulheres são frequentemente justificadas por referências a atitudes tradicionais, históricas, religiosas ou culturais. Meninas possuem menos probabilidade de irem ou permanecerem em escolas do que meninos. Mulheres frequentemente têm suas mobilidades limitadas por conta das expectativas de que serão cuidadoras. Elas frequentemente têm opções limitadas sobre com quem se casar – ou se vão casar – e pouco controle sobre suas escolhas reprodutivas.
Apesar daquilo que ainda precisa ser alcançado, as mulheres pioneiras que foram parte do processo de elaboração da DUDH de 1946 a 1948 preservaram a igualdade como um objetivo universal, e forneceram a base na lei internacional para aqueles que ainda lutam para torná-la uma realidade. Não apenas para as mulheres, é claro, mas também para pessoas com deficiências, idosos, membros de minorias étnicas e religiosas, grupos indígenas, migrantes, crianças e qualquer um em qualquer lugar enfrentando discriminação.
Fonte: ONU Brasil