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quarta-feira, 8 de junho de 2022

Turquia muda nome na ONU para “Türkiye”

A Turquia comunicou às Nações Unidas que, por desejo de seu presidente, deseja ser apresentada a partir de agora como “Türkiye” em todos os idiomas, anunciou a ONU na quinta-feira.

“A mudança é imediata”, disse à AFP Stephane Dujarric, porta-voz do secretário-geral da ONU, Antonio Guterres.

Ele explicou que uma carta oficial de Ancara recebida na quarta-feira na sede da ONU formalizou de maneira imediata a mudança de nome da Turquia.

Na terça-feira, o mministro turco das Relações Exteriores, Mevlüt Cavusoglu, publicou no Twitter uma carta enviada ao secretário-geral da ONU na qual exibia que o “nome do país na ONU, em idiomas estrangeiros, seja registrado como ‘Türkiye'”.

Ancara evita assim que o nome do país em inglês seja “Turkey”, una palavra que nesta língua também significa “peru” e que, portanto, poderia adquirir uma conotação negativa.

O chefe da diplomacia turca se referiu em seu tuíte ao desejo do presidente Erdogan, desde o fim 2021, de “aumentar o valor da marca” de seu país.

De fato, na área econômica, Ancara tenta há alguns anos impor no cenário internacional a marca “made in Türkiye”, em detrimento do “made in Turkey”

“Alguns podem considerar a mudança de nome um bobagem, mas coloca Erdogan no papel de protetor e salvaguarda do respeito internacional pelo país”, declarou Mustafa Aksakal, professor de História da Universidade de Georgetown, em Washington D.C., ao jornal The New York Times.

O jornal lembra que em junho de 2023, quando Erdogan completará 20 anos no poder, a Turquia terá eleições presidenciais e também celebrará o centenário de sua fundação após o desmantelamento do Império Otomano.

Fonte

terça-feira, 22 de setembro de 2020

Poeta cearense transforma Carta da ONU em cordel

Apesar de o Artigo 26 da Declaração Universal dos Direitos Humanos prever que “todo ser humano tem direito à educação”, o cordelista cearense Tião Simpatia teve este direito negado. Analfabeto até os 15 anos, não conseguiu estudar porque não havia escola perto de sua casa, na zona rural da cidade de Granja (CE). Hoje, ele conscientiza jovens por meio da literatura de cordel.

Após visitar dezenas de escolas no Ceará para mostrar o Cordel da Lei Maria da Penha, Tião lançou no fim de 2018 o Cordel da Carta das Nações Unidas, inspirado no tratado que fundou a Organização, em 1945. Segundo o poeta popular, o objetivo do cordel é popularizar e facilitar a compreensão do texto da Carta.

“A ideia do cordel surgiu do desejo de falar um pouco mais da importância dos direitos humanos. A gente trabalha muito em ambientes escolares com jovens, adolescentes, comunidades carentes. Imaginei que, assim como conseguimos popularizar o texto jurídico da Lei Maria da Penha através do cordel, da mesma forma poderíamos atingir um público maior”, disse em entrevista à ONU Brasil. “Fica mais fácil de as pessoas entenderem, contextualizando um pouco a partir da Carta das Nações Unidas”.

O cordel impresso foi lançado pelo Instituto de Estudos e Pesquisa sobre o Desenvolvimento do Ceará, órgão da Assembleia Legislativa do estado, em parceria com a Associação de Parentes e Amigos de Vítimas de Violência.

“Um texto tão importante como esse, entendo que não pode ficar restrito a pessoas que são mais ligadas a essas questões, ele deveria ser mais divulgado. A ideia é poder levar isso a um número maior de pessoas e o cordel nos possibilita, através das redes sociais, da Internet como um todo, alcançar um número muito bom de pessoas”, disse.

Segundo o cordelista, o intuito é mostrar o Cordel da ONU após apresentações do Cordel Maria da Penha, propondo reflexões e criando um canal de comunicação com jovens e adolescentes. Mais de 70 escolas do Ceará já foram visitadas desde 2014, abrangendo Fortaleza e região metropolitana, em parceria com o Instituto Maria da Penha e com o governo do estado. No Piauí, mais de 50 mil alunos da rede municipal de ensino de Teresina participaram das palestras do cordelista entre 2014 e 2016.

“A arte pode abrir caminhos utilizando as ferramentas digitais, as redes sociais. A gente procura, de certa forma, tirar proveito disso. No sentido de usar essas ferramentas para poder popularizar alguns conceitos”, afirmou.

Um exemplo desta popularização é o vídeo no qual a jovem Samya Abreu declama o cordel “O Brasil Que eu Quero”, de Tião.



Agora, o objetivo é transformar em verso a Declaração Universal dos Direitos Humanos. Segundo o cordelista, o trabalho já está em andamento.

Tião Simpatia é parceiro da ONU Mulheres desde 2011 e integrante da Rede de Artistas da Campanha UNA-SE pelo fim da violência contra as mulheres, criada em 2001. A rede conta atualmente com mais de 71 artistas, que têm como meta expressar compromisso e desejo de contribuir com os esforços das Nações Unidas, disseminando os objetivos, o trabalho e as atividades da Campanha.

Leia abaixo o Cordel da Carta das Nações Unidas. 

I

A carta mais importante

Da história da humanidade

É a das Nações Unidas

Falo com propriedade.

Pois nela está o preceito

Da justiça e do direito

Princípios fundamentais

Que formam laço profundo

Para garantir ao mundo

A manutenção da paz.

II

Após a II Guerra

Mundial a humanidade

Estava estarrecida

Com tamanha crueldade.

O mundo estava exausto

Por causa do Holocausto

Hiroshima e Nagasaki…

Resolveram então se unir

Para poder prevenir

Nova guerra; novo ataque!

III

Eis o Preâmbulo da carta,

Ouçamos atentamente!

Pois é ela que nos farta

De vida e paz permanente

No contexto mundial,

Econômico e social,

Da justiça e do direito.

Não existe paralelo

Esse é o texto mais belo

Que já li, o mais perfeito.

“NÓS, OS POVOS DAS NAÇÕES UNIDAS, RESOLVIDOS a preservar as gerações vindouras do flagelo da guerra, que por duas vezes, no espaço da nossa vida, trouxe sofrimentos indizíveis à humanidade, e a reafirmar a fé nos direitos fundamentais do homem, na dignidade e no valor do ser humano, na igualdade de direitos dos homens e das mulheres, assim como das nações grandes e pequenas, e a estabelecer condições sob as quais a justiça e o respeito às obrigações decorrentes de tratados e de outras fontes do direito internacional possam ser mantidos, e a promover o progresso social e melhores condições de vida dentro de uma liberdade ampla.

E PARA TAIS FINS, praticar a tolerância e viver em paz, uns com os outros, como bons vizinhos, e unir as nossas forças para manter a paz e a segurança internacionais, e a garantir, pela aceitação de princípios e a instituição dos métodos, que a força armada não será usada a não ser no interesse comum, a empregar um mecanismo internacional para promover o progresso econômico e social de todos os povos.

RESOLVEMOS CONJUGAR NOSSOS ESFORÇOS PARA CONSECUÇÃO DESSES OBJETIVOS. Em vista disso, nossos respectivos Governos, por intermédio de representantes reunidos na cidade de São Francisco, depois de exibirem seus plenos poderes, que foram achados em boa e devida forma, concordaram com a presente Carta das Nações Unidas e estabelecem, por meio dela, uma organização internacional que será conhecida pelo nome Nações Unidas” .

IV

Os propósitos e princípios

Que estão assegurados

Nesta Carta Universal

Não podem ser violados.

Asseguram às nações

Amistosas relações

Baseadas no respeito

Ao princípio de igualdade

Para toda a humanidade

Esse foi o maior feito.

V

Que não se repitam mais

As barbáries de outrora

Prevaleça sempre a paz

Na casa que a gente mora;

No mundo que a gente vive.

No nosso eu, inclusive!

Na terra que a gente habita

Nunca mais se faça a guerra!

Pois entre o céu e a terra

Paz é a coisa mais bonita.

VI

Então, meu irmão,

Pegue a semente da paz,

E plante no seu coração

Que é o solo mais fértil

Pra fazer a plantação.

Depois plante no seu lar

E continue a semear

Na sua comunidade…

Regue tudo com amor

Pra fazer brotar a flor

Da paz na humanidade.

Fonte: ONU

quarta-feira, 15 de janeiro de 2020

Morte de Soleimani: o que diz lei internacional sobre ataque dos EUA?


Entre os muitos debates envolvendo o assassinato do general iraniano Qasem Soleimani está a dúvida de se os EUA tinham base legal para ordenar o ataque aéreo, realizado em solo iraquiano na quinta-feira passada (02.jan.2020).

"O ataque tinha como objetivo impedir futuros planos de ataques iranianos", argumentou o governo americano ao defender sua ação.
Quais são, então, as questões-chave envolvendo a legalidade (ou não) desse ato, segundo a lei internacional?

O que diz a lei
A lei relevante ao tema no Estatuto da ONU permite que um Estado aja em autodefesa "se ocorrer um ataque armado".
Mas essa definição é, na prática, sujeita à interpretação de governos, dizem especialistas.
"No caso de Soleimani, os EUA estão alegando ter agido em autodefesa para impedir ataques iminentes, uma categoria de ação que, se for verdadeira, é geralmente vista como admissível sob o Estatuto da ONU", afirma Dapo Akande, professor de Direito Internacional da Universidade de Oxford e codiretor do Instituto de Ética, Direito e Conflito Armado (ELAC) da instituição.
No entanto, para Agnes Callamard, relatora especial da ONU para execuções extrajudiciais, é improvável que a ação dos EUA se enquadre nessa categoria.
"Os limites para a chamada autodefesa antecipada são muito estreitos: é necessário que (a necessidade de autodefesa) seja 'imediata, esmagadora e não deixe outra escolha de meios e não deixe tempo para deliberações'", ela tuitou. "É improvável que esses requisitos sejam cumpridos em casos assim."
Um relatório de 2010 da ONU sobre "mortes alvejadas" afirmava que havia um substancial corpo de acadêmicos que defendiam o mesmo raciocínio citado por Callamard.
O comunicado inicial do Departamento de Defesa dos EUA sobre a morte de Soleimani omitia a palavra "iminente" e afirmava que o ataque aéreo visava impedir ataques futuros iranianos e que Soleimani estaria "ativamente desenvolvendo planos de alvejar diplomatas e funcionários no Iraque e pela região".
Em comunicados posteriores, autoridades americanas, incluindo o presidente Donald Trump, afirmaram que Soleimani planejava "ataques iminentes".
Elizabeth Warren, pré-candidata democrata à Presidência dos EUA, rebateu afirmando que "o governo não consegue acertar sua narrativa".

Há evidências de que o Irã planejava um ataque iminente?
A legalidade do ataque sob a lei internacional pode depender de os EUA oferecerem evidências desses futuros ataques iminentes, afirma Akande.
O governo americano não tornou esses detalhes públicos, mas disse que inteligência a respeito foi compartilhada com membros do Congresso ligados à política externa do país.
Questionado por um jornalista na terça-feira (7/1) a respeito dessas ameaças iminentes vindas do Irã, o secretário de Estado Mike Pompeo citou os episódios que anteciparam o ataque de quinta-feira — o ataque à embaixada americana do Iraque, que os EUA atribuem ao Irã; ataques de milícias xiitas a bases iraquianas que abrigam tropas americanas —, mas não mencionou provas a respeito de ataques futuros.
Há outras justificativas que foram citadas no passado, segundo Ralph Wilde, especialista em Direito Público Internacional do University College London.
"Desde o 11 de Setembro (de 2001), os EUA têm adotado a visão de que a autodefesa pode ser justificada para prevenir ataques de longo prazo — quando o ataque está sendo planejado, mas não é iminente. O governo Obama usou esse argumento para justificar ataques com drones", afirma.

E quanto ao consentimento iraquiano?
Outra questão em debate é se os EUA tinham de ter pedido consentimento do Iraque para realizar um ataque dentro de seu território.
O governo iraquiano afirmou que o episódio foi "uma flagrante violação da soberania" do país, e o Parlamento aprovou uma resolução (não vinculante) pedindo que as tropas americanas deixem o Iraque — algo que o governo americano rejeita fazer até o momento.
Há cerca de 5 mil militares no país, sobretudo em tarefas de apoio às tropas iraquianas e no combate ao grupo autodenominado Estado Islâmico.
Os EUA podem argumentar que sua presença ali já deixa implícito algum tipo de consentimento à sua ação no país, dando-lhes o direito de proteger seus interesses e cidadãos dentro do Iraque.
Mas Akande argumenta que, na prática, os termos do acordo entre o Iraque e as tropas americanas não se estendem à possibilidade de se executar um ataque como o que matou Soleimani.

É permitido alvejar pontos de relevância cultural?
No domingo, Trump ameaçou Teerã com ataques a 52 pontos de interesse iranianos, "alguns de alto nível e muito importantes ao Irã e à cultura iraniana".
O chanceler iraniano, Javad Zarif, afirmou que um eventual ataque a um patrimônio cultural iraniano constituiria um crime de guerra.
"(A ameaça de Trump) mostra um cruel desprezo pelo estado de direito internacional", declarou Andrea Prasow, da organização Human Rights Watch.
O governo dos EUA tem insistido que seus ataques ocorreriam dentro da lei.
Mas um eventual ataque contra um patrimônio cultural violaria diversos tratados internacionais.
A Convenção de Haia de 1954 pela Proteção de Propriedade Cultural protege sítios culturais, em reação à destruição de patrimônio cultural ocorrido na Segunda Guerra Mundial, e tem os EUA como signatários.
Em 2017, a ONU aprovou uma resolução em reação a ataques do Estado Islâmico (EI), condenando "a destruição ilegal de patrimônio cultural, incluindo de locais e artefatos religiosos".
Os EUA estiveram entre os mais duros críticos do EI quando o grupo extremista alvejou a cidade histórica síria de Palmira, em 2015, e quando o grupo Talebã demoliu os Budas de Bamiyan, no Afeganistão, em 2001.
Em 2016, pela primeira vez, o Tribunal Penal Internacional fez uma condenação com base em crimes contra patrimônio histórico. Ahmad Al Faqi Al Mahdi, ligado à Al-Qaeda, foi considerado culpado pelo "crime de guerra de intencionalmente direcionar ataques contra edificações religiosas e históricas" em Timbuktu, no Mali, em 2012. Al Mahdi foi condenado a nove anos de prisão.
Os EUA não são parte do Tribunal Penal Internacional, mas são signatários de outros acordos de proteção a propriedade cultural — e qualquer ataque do tipo representaria uma significativa reversão.

Fonte: BBC

quarta-feira, 16 de outubro de 2019

Decisão do STF sobre união homoafetiva é reconhecida pela ONU


O presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Dias Toffoli, comunicou na sessão plenária desta quarta-feira, 12, que a Organização das Nações Unidas (ONU) certificou como patrimônio documental da humanidade os processos em que o STF reconheceu a união estável para casais do mesmo sexo e a garantia dos direitos fundamentais aos homossexuais.
As ações (ADI 4277 e ADPF 132) foram julgadas pela Suprema Corte em maio de 2011. "Esse reconhecimento representa a consolidação dos diretos alcançados pela sociedade e o compromisso do estado brasileiro de construir uma sociedade mais livre, justa e solidária, sem preconceitos de origem, raça, cor ou quaisquer outras formas de discriminação", afirmou Toffoli, anotando que o Brasil foi o primeiro País a reconhecer este direito por decisão judicial.
O reconhecimento será tema de evento nesta quarta-feira, às 18h, quando o Comitê Nacional do Brasil do Programa Memória do Mundo da Unesco entregará o certificado MoWBrasil 2018 ao STF. O ex-ministro Ayres Britto foi o relator das ações julgadas pelo STF, e representará a Corte na cerimônia que será realizada hoje no Instituto Histórico-Cultural da Aeronáutica, no Rio de Janeiro (RJ).


segunda-feira, 20 de maio de 2019

Quantos países existem – e por que é tão difícil responder a essa pergunta?


Se você sabe dizer sem sombra de dúvida quantos países há no mundo hoje, parabéns. Mas saiba que será fácil contestar esse número.
Dependendo dos critérios utilizados, ou de que instituição usar como fonte da informação, o número pode variar entre 193 e 206.
Na verdade, a resposta depende de como exatamente se define um "país".
"Para que se possa considerar um país, uma região precisa ter um território definido, ser habitado com algum grau de permanência, ter instituições políticas e governo próprio, ter a independência reconhecida por outros Estados soberanos e interagir diplomaticamente com outros países", disse à BBC News Brasil Martin Purvis, especialista em geografia história e política da Universidade de Leeds, na Inglaterra.
Mas é nos últimos dois critérios que as coisas se complicam. Há territórios que declararam sua independência e até funcionam, em grande parte, como países, mas não tiveram sua soberania reconhecida por toda a comunidade internacional.
"Assim como a beleza, o 'status de país' está nos olhos de quem vê", brinca Purvis. Ou seja, a existência de um país depende muito do contexto político.
"O reconhecimento de um país por outro é sempre uma negociação de interesses. Por exemplo, após a revolução comunista na China, dissidentes capitalistas fundaram Taiwan, e o país chegou a ser membro da ONU. Mas a China é um país de muito peso na comunidade internacional. Em 1971, a República Popular da China entrou na ONU e Taiwan foi retirado. Vários países deixaram de reconhecê-lo", explica.

A contagem da ONU
As Nações Unidas são a principal referência no número de países conhecido pela maioria das pessoas, mas a organização não está livre de polêmicas.



Desde 2011, com a entrada o Sudão do Sul, o órgão tem 193 países-membros, considerados Estados soberanos, com suas próprias fronteiras e governos independentes. E também conta com dois Estados observadores, o Vaticano e a Palestina, o que dá um total de 195 países.
A ONU reconhece que o governo palestino existe e que é um legítimo representante daquele povo, mas a Palestina não é reconhecida como Estado soberano por alguns dos países da própria ONU. Por isso, algumas listas mostram apenas 194 países na organização.
"Entrar na ONU é considerado o fiel da balança para que um território seja considerado um país. O Kosovo, por exemplo, é reconhecido por 112 países da ONU, é membro do Banco Mundial e no Fundo Monetário Internacional (FMI). Mas, por ainda não estar na ONU, ainda é considerado um país de reconhecimento parcial", explica Alex Jeffrey, professor de geografia humana da Universidade de Cambridge, na Inglaterra.
Mas o que é preciso para que um país entre na ONU? Depende especialmente de negociações políticas, diz Jeffrey.
Em sua carta de fundação, a ONU diz que podem ser membros quaisquer "Estados amantes da paz que aceitem as obrigações desta Carta e, no julgamento da Organização, consigam realizar estas obrigações".
Na prática, o documento também estabelece que um Estado só se torna membro quando o Conselho de Segurança recomenda sua entrada na Assembleia Geral.
No Conselho, a adição de um novo país tem de ser aprovada por ao menos nove dos 15 membros, sem que um dos cinco membros permanentes (China, Estados Unidos, Reino Unido, França e Rússia) use seu poder de veto.
Mas, além dos interesses da comunidade internacional, a política interna de cada país também define quem será reconhecido e quem não será.
"A Espanha, por exemplo, não vai reconhecer Kosovo tão cedo, porque isso pode fortalecer os movimentos separatistas em seu próprio país, como na Catalunha. Países como Rússia, China, Irã e Paquistão também resistem a reconhecer novos Estados por receio de fortalecer grupos separatistas dentro deles. Então, Kosovo dificilmente vai virar membro da ONU", disse à BBC News Brasil Fiona McConnell, doutora em geografia humana e professora na Universidade Oxford.

Países com reconhecimento parcial
Além de Taiwan, há outros cinco países que ainda não fazem parte da ONU, mas são reconhecidos diplomaticamente como Estados soberanos por ao menos um país-membro.
São países que se declararam independentes e, em geral, funcionam dessa forma.
No entanto, seu reconhecimento oficial ainda é alvo de disputa. Muitas vezes, eles nem aparecem nos mapas-mundi oficiais.



Kosovo, que era parte da Sérvia e foi criado em 2008, é reconhecido por mais de cem países. A Ossétia do Sul e a Abecásia, na região do Cáucaso, se declararam independentes da Geórgia em 1991, mas são reconhecidas apenas por cinco países.
A República Árabe Saaraui Democrática foi declarada independente em 1976, no território do Saara Ocidental, disputado com o Marrocos. Atualmente, 46 países-membros da ONU a reconhecem.
Já a República Turca de Chipre do Norte, que declarou independência do Chipre em 1983, só é reconhecida pela Turquia. Bangladesh e Paquistão chegaram a reconhecer o território como país, mas voltaram atrás por pressão dos Estados Unidos na ONU.

As nações olímpicas
É comum ouvir comentários de "não sabia que existiam tantos países!" na cerimônia de abertura dos Jogos Olímpicos. Atualmente, 206 nações desfilam apresentando suas delegações, às vezes compostas por um só atleta.
"O reconhecimento de um país em eventos culturais ou esportivos, como a Olimpíada, é visto como um símbolo da existência de uma nação. Aparecer com sua bandeira, seus atletas e seus torcedores dá uma visibilidade importante", afirma Alex Jeffrey.
Mas como o Comitê Olímpico Internacional (COI) chegou a 206 membros? Se contássemos todos os países mencionados neste texto até aqui, seriam 204. E o Vaticano não tem uma delegação olímpica.
A questão é que, durante a maior parte da existência dos Jogos Olímpicos, não era necessário ser um país independente para participar.
Atualmente, participam do COI os 193 membros efetivos da ONU, um dos seus membros observadores, a Palestina, e dois países que têm apenas reconhecimento parcial, Taiwan (chamado de Taipei Chinês) e Kosovo.



Além deles, há dez territórios que, na verdade, são territórios dependentes de outros países: Porto Rico, Ilhas Virgens Americanas, Samoa Americana e Guam (EUA); Ilhas Cayman, Bermudas e Ilhas Virgens Britânicas (parte do Reino Unido); Ilhas Cook (Nova Zelândia); Aruba (Holanda) e Hong Kong (China).






Desde 1996, o comitê deixou de admitir territórios como este. Os que já estão no grupo permaneceram, mas só novos Estados independentes poderão entrar, como aconteceu com o Sudão do Sul em 2011.
"Não há dúvida de que essas decisões do COI também são políticas. Elas dependem de negociações profundas, porque ser reconhecido nos Jogos Olímpicos é algo usado por muitos territórios e nações para fortalecer o argumento de que são países independentes", diz o geógrafo.
E se falarmos apenas de futebol, há ainda mais nações - mais precisamente, 211. Isso porque no passado, além de admitir alguns territórios dependentes diferentes do COI, a FIFA também deixou que Inglaterra, Escócia, País de Gales e Irlanda do Norte entrassem com seleções separadas.
"Acho que isso acontece porque nós, britânicos, inventamos o jogo e estávamos lá primeiro. Criamos as regras e, durante algum tempo, fazíamos o que queríamos. Agora, não é mais assim", brinca o geógrafo britânico Martin Purvis.

Podemos ter novos países em breve?
Os inícios das décadas de 1960 e 1990 foram os períodos em que mais países entraram, em curto espaço de tempo, na ONU. Entre 1958 e 1960 foram 16, quase todos africanos. Entre 1991 e 1992 foram 13, a maioria do leste europeu.
"Tivemos picos de criação de países por causa da descolonização de países africanos e também na era pós-União Soviética. É difícil imaginar algo assim no futuro próximo", afirma Purvis.
"Mas ainda há Estados que são produto da colonização europeia e, até hoje, não são completamente coerentes. O Sudão, que agora se dividiu, era um deles. Então, é possível que vejamos mais divisões."
Para Alex Jeffrey, as mudanças na geopolítica mundial ainda podem provocar surpresas, mesmo de onde não se esperava.
"É só olhar para o que está acontecendo no Reino Unido. Agora temos a saída da União Europeia e a possibilidade de um novo referendo sobre a independência da Escócia. Se isso acontecer, uma região que pensávamos estar bem definida vai mudar", afirma.
Da próxima vez que lhe perguntarem quantos países há no mundo, talvez seja mais correto responder com outra pergunta: "segundo quem?".
"Nós sempre tivemos essa situação confusa, uma mistura de Estados e não-Estados. Na verdade, o mapa político do mundo é uma ficção. Ele nunca foi organizado, e continua não sendo", diz a geógrafa Fiona McConnel.


Fonte: BBC Brasil

sexta-feira, 4 de janeiro de 2019

Saiba as diferenças entre os pactos globais para refugiados e migrantes

Os termos “refugiado” e “migrante” têm sido utilizados sem distinção para descrever as milhões de pessoas em todo o mundo que fogem de conflitos ou buscam melhores condições de vida.
Ao mesmo tempo em que as Nações Unidas se propõem a garantir pactos globais para melhor protegê-las, é essencial entender as diferenças que existem entre os dois grupos.
Um novo acordo internacional para desenvolver uma resposta mais forte e justa aos grandes movimentos de refugiados, conhecido como Pacto Global sobre Refugiados, foi endossado pelos membros da Assembleia Geral da ONU nesta terça-feira (18). Saiba mais nesta reportagem especial.
Os termos “refugiado” e “migrante” têm sido utilizados sem distinção para descrever as milhões de pessoas em todo o mundo que fogem de conflitos ou buscam melhores condições de vida.
Ao mesmo tempo em que as Nações Unidas se propõem a garantir pactos globais para melhor protegê-las, é essencial entender as diferenças que existem entre os dois grupos.
Um novo acordo internacional para desenvolver uma resposta mais forte e justa aos grandes movimentos de refugiados, conhecido como Pacto Global sobre Refugiados, foi endossado pelos membros da Assembleia Geral da ONU nesta terça-feira (18).
O objetivo é aumentar apoio aos que fogem de suas terras de origem e aos países anfitriões, que frequentemente estão entre os mais pobres do mundo.
O pacto visa fornecer um modelo robusto e sistemático para melhorar a vida dos refugiados e das comunidades anfitriãs após dois anos de intensas consultas – o que pode parecer familiar para quem está acompanhando o progresso do Pacto Global para Migração Segura, Ordenada e Regular, adotado em Marrakesh em 10 de dezembro.
O UN News produziu este guia para explicar a principal diferença entre o status de migrante e de refugiado e as diferenças entre os dois pactos apoiados pelas Nações Unidas que visam melhorar a vida de todas as pessoas que estão em movimento.

Acabamos de ouvir que o Pacto Global para Migração foi adotado recentemente. Por que precisamos de outro acordo?

A Declaração de Nova York, adotada em setembro de 2016, deu origem a dois acordos: um sobre refugiados e outro sobre migrantes. Embora ambos sejam grupos de pessoas que vivem fora de seus países de origem, há distinções fundamentais entre os termos “refugiado” e “migrante”. Os dois acordos são de natureza voluntária e não são instrumentos legalmente vinculantes.

Qual é a diferença entre um migrante e um refugiado?
Os refugiados são pessoas que estão fora do seu país de origem por medo de perseguição, conflito, violência generalizada ou outras circunstâncias que perturbaram gravemente a ordem pública, e, como resultado, precisam de proteção internacional. A definição de refugiado pode ser encontrada na Convenção de 1951 e nos instrumentos regionais para refugiados, assim como no Estatuto do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados.
Embora não haja uma definição legal formal de migrante internacional, a maioria dos especialistas concorda que migrante é a pessoa que muda de seu país de residência habitual, independentemente do motivo da migração ou da situação legal. Geralmente, é feita uma distinção entre migração de curto prazo ou temporária, cobrindo movimentos com duração entre três e 12 meses, e migração a longo prazo ou permanente, referindo-se a uma mudança de país de residência por um período de um ano ou mais.
“Sou migrante, mas não tive que arriscar minha vida em um barco furado ou pagar traficantes. A migração segura não pode ser limitada à elite global”, disse o secretário-geral das Nações Unidas, António Guterres.

Isto significa que a Convenção sobre Refugiados não é suficiente?
O pacto complementa, mas não substitui, o sistema legal internacional existente para refugiados — incluindo a Convenção de Refugiados de 1951 e outros instrumentos legais internacionais sobre refugiados, direitos humanos e lei humanitária.
“A Convenção sobre Refugiados se concentra nos direitos dos refugiados e nas obrigações dos Estados, mas não trata da cooperação internacional em grande escala. E é isso que o pacto global procura resolver”, explicou Volker Türk, alto-comissário assistente para proteção da Agência da ONU para Refugiados (ACNUR).
A Convenção de 1951 não especifica como devem ser compartilhados os encargos e as responsabilidades, e é isso que o pacto global faz. “Ele responde a uma das principais lacunas que enfrentamos há décadas”.

Mas por que precisamos de um novo acordo internacional?
No final de 2017, havia quase 25,4 milhões de refugiados em todo o mundo, mais de metade deles com menos de 18 anos. Hoje, apenas 10 países abrigam 60% dos refugiados do mundo. Só a Turquia acolhe 3,5 milhões de refugiados, mais do que qualquer outro país. Além disso, a maioria dos refugiados do mundo, ou 85%, vive em países em desenvolvimento que enfrentam seus próprios desafios econômicos e de desenvolvimento.
Dez doadores governamentais, incluindo a União Europeia, fornecem quase 80% do financiamento do ACNUR, por exemplo, e mais de dois terços dos pedidos de reassentamento da agência da ONU são atendidos por apenas cinco países. A diferença entre as necessidades dos refugiados e a ação para atendê-las é grande e crescente.

Quem decidiu criar este pacto? A ONU, o ACNUR?
Não, o pacto foi decidido pelos Estados-membros. A Declaração de Nova York para Refugiados e Migrantes, adotada pelos Estados-membros em setembro de 2016, incluiu duas etapas principais em relação aos refugiados:
• Primeiro, os Estados-membros adotaram o quadro abrangente de resposta aos refugiados, que define um vasto leque de medidas a serem tomadas pela comunidade internacional quando se responde a uma situação de refugiados em grande escala.
• Segundo, os Estados-membros concordaram em continuar a melhorar as respostas internacionais, trabalhando para a adoção de um “pacto global sobre refugiados” em 2018. Eles pediram para o ACNUR consultar Estados-membros e as mais diversas partes interessadas para propor tal pacto. A proposta do pacto global para os refugiados foi lançada em 20 de julho de 2018.

Como foi negociado o Pacto Global sobre Refugiados?
O pacto foi desenvolvido através de um amplo processo multilateral de consulta com os Estados-membros e outras partes interessadas.
Em 13 de novembro de 2018, a Comissão Social, Humanitária e Cultural da Assembleia Geral da ONU, conhecida como a Terceira Comissão, aprovou a resolução que afirma o pacto de refugiados com maioria esmagadora e enviou o texto à plenária da Assembleia Geral para adoção, agendada para 17 dezembro de 2018.

Como funcionará o Pacto Global sobre Refugiados?
O pacto global sobre refugiados estabelece a arquitetura para uma resposta internacional mais forte, mais previsível e mais equitativa às grandes situações de refugiados.
Embora não seja legalmente vinculante, o documento orienta a comunidade internacional no apoio aos refugiados, aos países e às comunidades que abrigam grandes números deles por meio da mobilização da vontade política, ampliação da base de apoio e ativação de arranjos para a partilha de encargos e de responsabilidades mais equitativa e previsível.
“Os refugiados são uma preocupação internacional e uma responsabilidade compartilhada”, destacou o alto-comissário das Nações Unidas para os Refugiados, Filippo Grandi. “No pacto, teremos pela primeira vez um modelo prático viável, um conjunto de ferramentas que traduz esse princípio em ação”.
“Décadas mantendo os refugiados separados, relegados aos acampamentos ou à margem da sociedade estão dando lugar a uma abordagem fundamentalmente diferente – incluindo refugiados nos sistemas nacionais, sociedades e economias de seus países anfitriões pelo tempo que for necessário, e permitindo que eles possam contribuir para suas novas comunidades e garantir seu próprio futuro, na pendência de uma solução para a sua situação”, explicou Grandi, destacando que o pacto global começou com a generosidade dessas comunidades.

O Pacto Global sobre Refugiados possui quatro objetivos:
1. Aliviar pressão sobre países que abrigam um grande número de refugiados;
2. Construir a autoconfiança dos refugiados;
3. Expandir o acesso a países terceiros ou a refugiados através do reassentamento e de outras vias de admissão;
4. Condições de apoio que permitam aos refugiados regressarem aos seus países de origem;

Meu país será obrigado a receber refugiados?
Não mais do que já é. A Convenção de Refugiados de 1951 tem foco nos direitos dos refugiados e nas obrigações dos Estados. O Pacto Global sobre Refugiados reafirma esses padrões e princípios.
O pacto não tem objetivo de criar encargos ou imposições adicionais sobre países que abrigam um grande número de refugiados, nem modificar o mandato de proteção e soluções do ACNUR. Ele busca se basear no regime internacional de refugiados que foi estabelecido ao longo de décadas.

Meu país já hospeda muitos refugiados. Vamos receber mais ajuda?
Em contextos específicos de refugiados em grande escala, o pacto global prevê a possibilidade de um Estado de acolhimento ou país de origem solicitar a ativação, pelo ACNUR, de uma plataforma de apoio para auxiliar seus mecanismos nacionais de resposta.
“O que queremos alcançar é uma galvanização muito rápida de apoio: apoio político, financeiro e de reassentamento, para que países – ao enfrentar tal situação – sintam que não estão sozinhos, que não estão isolados, ou que ninguém se importa”, disse Türk. “Que a comunidade internacional se preocupa com as pessoas, mas também com o país afetado. E é solidária e age em solidariedade com eles. Esse é realmente o propósito”.

Que diferença tangível o pacto fará na vida dos refugiados ou das comunidades que os acolhem?
O alto-comissário assistente do ACNUR explicou que, se o pacto for implementado, veremos “melhor educação para meninos e meninas refugiados, bem como melhor acesso a serviços de saúde para todos os refugiados e mais oportunidades de subsistência”. As comunidades anfitriãs irão se envolver de maneira diferente com os refugiados, afastando-se das políticas de acampamentos.
Países anfitriões como Uganda, Ruanda, Irã, na América Central ou o Líbano – com sua infraestrutura e serviços de saúde enfrentando enormes desafios ao hospedar 1 milhão de refugiados – irão conseguir o apoio que precisam não apenas de uma perspectiva humanitária, mas de uma perspectiva de cooperação para o desenvolvimento. “Essa é a novidade”, acrescentou Türk.
Além disso, o ACNUR tem como objetivo conseguir mais locais de reassentamento e encontrar mais formas para que refugiados possam se deslocar para países terceiros – como por meio da reunificação familiar, bolsas de estudo ou vistos humanitários.

Mas se o pacto não é legalmente vinculante, ele pode realmente fazer a diferença?
Não é vinculante, mas a Assembleia Geral da ONU irá adotar o pacto global. “Uma vez feito isso, demonstra um compromisso político muito forte de todos os 193 Estados-membros para implementá-lo, mesmo que não seja legalmente vinculante”, disse Türk, destacando que “no mundo de hoje é dessa forma que o multilateralismo é frequentemente feito”.

Quem irá financiar todo esse processo?
O pacto global inclui a resposta em uma abordagem muito mais ampla de parcerias. O pacto analisa o que o setor privado, as comunidades religiosas e a instituição financeira internacional podem trazer para a mesa.
O Banco Mundial estabeleceu um instrumento financeiro específico para os países de baixa renda afetados pelo deslocamento forçado no valor de 2 bilhões de dólares por dois anos. O objetivo é ajudar a abordar o impacto socioeconômico dos fluxos de refugiados para uma parte de um país.


Fonte: ONUBR

quarta-feira, 19 de setembro de 2018

O caso Lula na ONU e a distância entre a teoria e a vigência dos direitos humanos

Na sexta-feira (17/8), o Comitê de Direitos Humanos da ONU proferiu uma decisão histórica e de alta relevância para a defesa das garantias fundamentais ao acolher o pedido de liminar que apresentamos em favor do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva para assegurar que ele possa “concorrer nas eleições de 2018” do Brasil, com “acesso adequado à imprensa e aos membros do seu partido político”.
Em 22 de maio, o mesmo órgão internacional já havia alertado o país para que não fosse realizada “qualquer ação que impeça ou frustre a apreciação” pelo comitê sobre as grosseiras violações a garantias fundamentais que apontamos no corpo do comunicado individual feito em favor do ex-presidente em 28 de julho de 2016 — mesma data em que anunciou que irá analisar o mérito das violações apontadas.
No pano de fundo do comunicado estão fatos notórios ocorridos antes e durante a ação penal em que Lula foi indevidamente acusado e condenado pela prática de “atos indeterminados” para, supostamente, beneficiar uma empreiteira em troca de uma parte do preço de uma afirmada reforma em apartamento em Guarujá (SP) que teria sido “atribuído” ao ex-presidente.
No início do procedimento internacional, apontamos violações aos seguintes dispositivos do Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos (PIDCPP):
  • Artigo 9 (1) e (4): proteção contra a prisão ou detenção arbitrária;
  • Artigo 14 (1): o direito a um tribunal independente e imparcial;
  • Artigo 14 (2): direito de ser presumido inocente até que se prove a culpa por lei; e
  • Artigo 17: proteção contra interferências arbitrárias ou ilegais na privacidade.
Em julho deste ano, requeremos ao comitê, adicionalmente, a análise de violação ao artigo 25 do PIDCPP, que impede a imposição de “restrições infundadas” ao direito de “votar e de ser eleito em eleições periódicas, autênticas, realizadas por sufrágio universal e igualitário por voto secreto, que garantiam a manifestação da vontade dos eleitores”. O pedido foi acolhido e também será objeto de oportuna apreciação pelo órgão internacional.
À época do protocolo do comunicado, possivelmente diante do ineditismo da medida e do desconhecimento da via, algumas vozes se levantaram para questionar a medida. Atualmente, outras vozes — em regra interessadas no desfecho do processo eleitoral ou mesmo em impedir a candidatura do ex-presidente por algum motivo — tentam converter a decisão e a obrigatoriedade de seu cumprimento pelo país em mera “recomendação” ou em situação de menor relevância jurídica.
Nada mais descabido. Em 2009, de forma soberana e juridicamente válida, o Brasil reconheceu a jurisdição do Comitê de Direitos Humanos da ONU ao aprovar o Protocolo Facultativo ao Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos por meio do Decreto Legislativo 311/2009. Vale dizer, aquilo que era facultativo — a aprovação do protocolo e da jurisdição do comitê — tornou-se obrigatório e vinculante a partir da edição desse ato normativo.
Neste ponto, relevante uma digressão. Após mensagem presidencial dirigida ao Congresso Nacional, o tema tramitou pelas comissões (i) de Relações Exteriores e de Defesa Nacional; (ii) de Direitos Humanos e Minorias; e (iii) de Constituição e Justiça e de Cidadania, todas da Câmara dos Deputados.
Na Comissão de Relações Exteriores e de Defesa Nacional, a relatoria coube ao deputado Luiz Carlos Hauly (PSDB-PR), que ressaltou em trecho de seu parecer que foi aprovado em 24/5/2006:
Entendemos que não figura entre as preferências de regimes ditatoriais a assinatura de tratados internacionais de proteção aos direitos humanos e que, em 1992, o Brasil firmava aos poucos, sua democracia. Contudo, quase quinze anos se passaram entre a assinatura do Pacto e seus Protocolos e quase dez desde a recomendação das Nações Unidas. Cabe ao Congresso, portanto, envidar esforços para que a aprovação dos Protocolos seja realizada da forma mais expedita possível”.
No âmbito da Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania, a relatoria coube ao deputado Bosco Costa (PSDB-SE), que apresentou parecer, aprovado em 4/9/2016, destacando o seguinte:
A adesão ao presente protocolo se harmoniza com a política adotada pelo Brasil em suas relações externas. O País já admite a competência de importantes órgãos internacionais de direitos humanos, nos âmbitos global e regional, para o exame de casos individuais, como a Comissão e a Corte Interamericanas de Direitos Humanos, o Comitê para a Eliminação da Discriminação racial e o Comitê para a Eliminação da Discriminação contra as Mulheres. Assim, a aprovação da competência do Comitê das Nações Unidas representa mais um avanço da política brasileira na defesa dos direitos humanos e no reconhecimento do indivíduo, em algumas situações, como sujeito de direito internacional”.
Por seu turno, na Comissão de Direitos Humanos e Minorias, a relatoria coube ao deputado Luiz Couto (PT-PB), que destacou em seu parecer, aprovado em 8/11/2006, o seguinte:
O texto é meritório. A adesão ao presente protocolo se coaduna com a política seguida pelo Brasil em suas relações externas, que, de maneira exemplar, defende a proteção internacional do ser humano. Nessa linha, o País já admite a competência de importantes órgãos internacionais de direitos humanos, nos âmbitos global e regional, para exame de casos individuais, como o Comitê para a Eliminação da Discriminação Racial, o Comitê para a Eliminação da Discriminação contra Mulheres e a Corte Interamericana de Direitos Humanos.
A aprovação da competência do Comitê das Nações Unidas representa mais um avanço da política brasileira no reconhecimento do indivíduo, em algumas situações, como sujeito de direito internacional”.
O Plenário da Câmara votou a matéria em 5/6/2008, e o Senado, em 10/6/2009, resultando na edição do já referido Decreto Legislativo 311, que foi promulgado pelo então presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP), em 16/6/2006.
Além da existência do aludido ato normativo que reconhece a jurisdição do Comitê de Direitos Humanos da ONU, o Brasil foi notificado sobre a existência do comunicado de Lula e, desde então, apresentou três manifestações perante aquele órgão. Em nenhuma delas o país recusou a jurisdição do comitê para analisar as violações apontadas pelo ex-presidente ou o caráter vinculante das decisões proferidas por aquela instância.
Ao contrário. Em manifestação apresentada em 27/1/2017, o Brasil afirmou: “219. O Estado brasileiro aproveita esta oportunidade para reafirmar seu compromisso com o Sistema de Direitos Humanos das Nações Unidas e particularmente com esse honorável Comitê de Direitos Humanos”.
Em outra manifestação, apresentada em 29/9/2017, a representação do país afirmou: “119. A República Federativa do Brasil reafirma aqui seu comprometimento com o Sistema das Nações Unidas de Direitos Humanos e com esse Comitê”. No mesmo sentido foi a manifestação apresentada em 04/04/2018.
É impensável e incompatível com a boa-fé, portanto, que, após confirmar o compromisso de respeitar as decisões do Comitê de Direitos Humanos da ONU por meio de decreto legislativo e também por manifestações no caso concreto de Lula, o Brasil possa se furtar ao cumprimento da decisão proferida pelo órgão internacional.
Oportuno lembrar, ainda, que a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal registra a obrigatoriedade da jurisdição das cortes internacionais de direitos humanos reconhecidas pelo Brasil. Embora se referindo à Corte Interamericana de Direitos Humanos, o decano da suprema corte, ministro Celso de Mello, fez registrar a necessária “observância, por parte dos Estados nacionais que voluntariamente se submeteram, como o Brasil, à jurisdição contenciosa da Corte Interamericana, dos princípios, direitos e garantias fundamentais assegurados e proclamados, no contexto do sistema interamericano, pela Convenção Americana sobre Direitos Humanos” (STF, AP 470 AgR-vigésimo quinto, rel. p/ o ac. min. Teori Zavascki, voto do min. Celso de Mello, j. 18-9-2013, P, DJE de 17-2-2014).
A Procuradoria-Geral da República também já se manifestou no mesmo sentido. Na ADFP 320/DF, embora também se referindo à Corte Interamericana de Direitos Humanos, o órgão máximo do Ministério Público Federal defendeu perante o Supremo Tribunal Federal que “as decisões proferidas pela Corte em face do Estado brasileiro têm força vinculante para todos os poderes e órgãos estatais. O cumprimento de suas sentenças é mandatório, nos termos da obrigação internacional firmada pela República”.
Na mesma manifestação, o então procurador-geral da República fez referência ao artigo 7º do ADCT e concluiu: “Houve, pois, decisão constitucional originária de inserir o Brasil na jurisdição de uma — ou mais — cortes internacionais de direitos humanos, o que constitui vetor interpretativo de conciliação do Direito e da jurisdição internos com o panorama normativo internacional a que o país se submeta, em processo integrativo também previsto nos §§ 2º e 4º do artigo 5º da Constituição”.
Acreditamos que o Brasil não irá se deixar contaminar pela antiga tentação de países que negam proteção a garantias fundamentais mediante a invocação de disposições do Direito interno. Até porque essa espécie de recusa é expressamente proibida pelo artigo 27 da Convenção de Viena sobre os Direitos dos Tratados, também aprovada pelo Brasil (Decreto 7.030/2009) sem qualquer reserva a essa disposição.
Buscamos superar, no caso Lula, a distância entre a teoria e a vigência real dos direitos humanos. O Comitê de Direitos Humanos da ONU apontou, por meio de suas recentes decisões, o acerto desse caminho e irá julgar o caso do ex-presidente Lula possivelmente em 2019. As determinações até aqui proferidas têm por objetivo impedir a ocorrência de danos irreparáveis ou que possam frustrar a execução da decisão final.
De acordo com a Observação Geral 33, editada pelo Comitê de Direitos Humanos da ONU em encontro realizado em Genebra de 13 a 31 de outubro de 2008, “em qualquer caso, os Estados-Pares terão que utilizar de todos os meios que estiverem ao seu alcance para dar efetividade às determinações do Comitê”.
Esperamos que as autoridades brasileiras e também os agentes não estatais de alguma forma envolvidos cumpram as decisões do Comitê de Direitos Humanos da ONU, porque eventual responsabilidade internacional sobreviverá a governos, a mantados, nomeações ou concessões. É o Brasil, como Estado-parte, que assumiu a obrigação de dar eficácia às deliberações daquela Corte Internacional de Direitos Humanos.
Por  e 
Fonte: Conjur

sábado, 2 de junho de 2018

ONU rejeita pedido de medidas cautelares de Lula para ser solto


Medida cautelar pedia que o governo brasileiro fosse impedido de prender o ex-presidente até que se esgotassem todos os recursos jurídicos

O Comitê de Direitos Humanos da ONU rejeitou o pedido do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva para que seja solto no Brasil, como parte de medidas cautelares solicitadas por seus advogados. O caso nas Nações Unidas, porém, não está encerrado e uma avaliação completa de sua situação, iniciada desde meados de 2016, continua a ser realizada.
O governo brasileiro terá mais seis meses para responder a uma série de perguntas formuladas pela ONU. Mas uma decisão, segundo a entidade, ficará apenas para 2019.
“O Comitê de Direitos Humanos não concederá medidas cautelares no caso de Lula da Silva”, declarou a porta-voz de Direitos Humanos da ONU, Julia Gronnevet.
Uma resposta positiva por parte da ONU significaria, na avaliação da entidade, apertar o botão de “pausa” num processo em andamento para que eventuais violações de direitos humanos fossem avaliadas. Nesse caso, os riscos de um dano irreparável não foram constatados.
O jornal O Estado de S. Paulo revelou com exclusividade no mês passado que um recurso ao Comitê de Direitos Humanos da ONU era uma possibilidade. Um dia antes de ser preso, enquanto Lula negociava com a Polícia Federal, seus advogados entraram com a queixa na ONU. A reportagem apurou que chamou a atenção do organismo a rapidez da decisão do juiz federal Sérgio Moro.
Uma eventual decisão de recomendar medidas urgentes ocorreria por conta da avaliação dos peritos da ONU de que a prisão lhe impediria de exercer plenamente seus direitos políticos. Mas o apelo não foi atendido.
Olivier de Frouville, um dos membros do Comite da ONU, explicou que a avaliação concluiu que “não houve um dano irreparável” com a prisão de Lula. “Tomamos medidas cautelas quando há um risco de dano irreparável”, explicou. “Olhando para o pedido dos advogados de defesa e para a situação presente, consideramos que, neste momento, não existe esse risco”, disse.
Um dos danos irreparáveis, segundo ele, seria a perda de direitos civis ou políticos por conta de uma ação. “Não estávamos convencidos de que isso era o caso”, disse. “Não há risco pessoal claro ainda”, apontou, alertando que o “estado presente é ainda muito incerto”.
De acordo com Frouville, o Comitê enviou uma carta ao governo brasileiro comunicando a decisão. Mas também alertando que o estado não poderá tomar medidas que sejam incompatíveis com o trabalho do Comitê e nem no caso de Lula.
“Vamos continuar atentos sobre o que ocorre nesse caso e, claro, os advogados de defesa tem o direito de voltar ao Comitê para pedir medidas cautelas caso tenham novas informações”, indicou. “Mas, neste ponto, o Comitê não vê risco de dano irreparável”, indicou.
Uma esperança entre aliados de Lula era de que a ONU seguisse a mesma decisão que já havia tomado em um caso que consideravam semelhante. Em março, ela atendeu a um pedido similar de políticos catalães, presos nos últimos meses. A ONU recomendou, por exemplo, que o deputado independentista Jordi Sanches, fosse liberado para que pudesse participar de eleições. Mas o estado espanhol ignorou a recomendação da ONU.

Eleição
Mesmo sem atender ao pedido dos advogados de Lula, a ONU continua a avaliar o caso e juntar em um mesmo processo a questão da admissibilidade e seu mérito. Mas alerta que dificilmente teria uma posição final antes de 2019, depois, portanto, das eleições presidenciais.
A queixa de Lula foi levada ao Comitê de Direitos Humanos Nações Unidas em julho de 2016, pelo advogado Geoffrey Robertson. A denúncia central era de que Moro estaria sendo parcial no julgamento do ex-presidente. Em outubro daquele ano, as equipes legais da ONU aceitaram dar início ao exame.
“Ainda não lidamos com o mérito do caso”, explicou Frouville. “Isso vai ser feito se o caso for aceito”, disse. De acordo com ele, o estado brasileiro recebeu seis meses de prazo para responder a uma série de questões. “Nesse momento, não há ainda uma decisão sobre a admissibilidade do caso”, disse.
Depois disso, a defesa de Lula ainda tem mais quatro meses para dar uma resposta aos comentários do Brasil. Se o obstáculo da admissibilidade for superado, o Comitê então avaliará seu mérito.
Yuval Shany, um dos 18 peritos do Comitê, explicou ao Estado no mês passada que o caso ainda está sendo avaliado no que toca sua admissibilidade. Para que o caso seja tratado em seu mérito, porém, ele aponta que primeiro há que se decidir se os remédios locais foram esgotados ou não.
“Só podemos lidar com o caso se isso foi totalmente resolvido pela Justiça doméstica. O sr. Lula sugeriu que as injustiças são tais, que não há remédios locais efetivos para ele no Brasil”, explicou Shany. “O estado (brasileiro) contesta isso. Portanto, precisamos primeiro decidir sobre essa questão”, disse.
Na fase inicial de a avaliação de uma queixa, não se avaliava o conteúdo do caso. Mas somente se a ONU tem o direito ou não de examinar e fazer suas recomendações. Em 2017, o governo brasileiro deu respostas às Nações Unidas sobre o caso, alegando que todas as instituições do estado estão “funcionando” e que os direitos do ex-presidente foram preservados.

Defesa
Para comentar a decisão da ONU, os advogados Cristiano Zanin Martins e Valeska Teixeira Zanin Martins, que defendes Lula, divulgaram a seguinte nota sobre o assunto.
“Recebemos hoje (22/05) do Comitê de Direitos Humanos da ONU, com satisfação, decisão que confirma que o órgão internacional está formalmente investigando as violações contra garantias fundamentais do ex-Presidente Lula que apresentamos em comunicado individual protocolado em julho de 2016. A admissibilidade do comunicado e o mérito serão julgados conjuntamente. Trata-se do primeiro comunicado individual feito por um brasileiro àquele órgão internacional”, escreveu.
“O Comitê também admitiu julgar o caso à luz do artigo 25 do Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos, que assegura a todo cidadão a possibilidade de participar ‘sem restrições infundadas’ o direito de ‘votar e ser eleito em eleições periódicas, autênticas, realizadas por sufrágio universal e igualitário por voto secreto, que garantam a manifestação da vontade dos eleitores’, diante de aditamento que apresentamos em 06/04/2018. O governo brasileiro terá 6 meses para apresentar defesa sobre o mérito do comunicado”.
“Na peça protocolada em julho de 2016, foram listadas diversas violações ao Pacto de Direitos Políticos e Civis, adotado pela ONU, praticadas pelo juiz e pelos procuradores da Operação Lava-Jato de Curitiba contra Lula, seus familiares e advogados. Esse Pacto prevê, dentre outras coisas: (a) proteção contra prisão ou detenção arbitrária (Artigo 9º); (b) direito de ser presumido inocente até que se prove a culpa na forma da lei (Artigo 14); (c) proteção contra interferências arbitrárias ou ilegais na privacidade, família, lar ou correspondência e contra ofensas ilegais à honra e à reputação (Artigo 17); e, ainda, (d) do direito a um julgamento independente e imparcial (Artigo 14)”.
“As evidências apresentadas no comunicado se reportam, dentre outras coisas: (i) à privação da liberdade por cerca de 6 horas imposta a Lula em 4 de março de 2016, por meio de uma condução coercitiva sem previsão legal; (ii) ao vazamento de materiais sigilosos para a imprensa e à divulgação de ligações interceptadas, inclusive entre Lula e seus advogados; (iii) a diversas medidas cautelares autorizadas injustificadamente; e, ainda, (iv) ao fato de o juiz Sergio Moro haver assumido em documento enviado ao Supremo Tribunal Federal, em 29/03/2016, o papel de acusador, imputando crimes a Lula por doze vezes, além de antecipar juízo de valor sobre assuntos pendentes de julgamento na 13ª. Vara Federal Criminal de Curitiba”.
“O Comitê de Direitos Humanos da ONU também decidiu que por ora não irá conceder uma medida liminar em favor de Lula, tal como requerido em 06/04, mas alertou as autoridades brasileiras de que é incompatível com as obrigações assumidas pelo Brasil no Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos qualquer ato de obstrução “que impeça ou frustre a análise pelo Comitê [da ONU] de um comunicado alegando violação ao Tratado, ou que afirme que a expressão dos entendimentos do Comité é frívola e fútil”, finalizam os advogados. Prisão de Lula: Fachin autoriza comissão de deputados a visitar ex-presidente.

Fonte: Exame