Depois de meses de tensão e um referendo feito à revelia do governo central da Espanha, o processo de independência da Catalunha foi suspenso pelo governo regional em nome do "diálogo".
Carles Puigdemont, o presidente do governo catalão que liderou a iniciativa para separar esta próspera região da Espanha, anunciou no Parlamento regional que "assume" o mandato que lhe fora conferido para buscar a independência da Catalunha, mas, logo em seguida, pediu aos deputados que suspendessem os efeitos da declaração de independência.
Puigdemont disse que seu ato era um gesto de "responsabilidade e generosidade" e que estendia "a mão ao diálogo".
A ambiguidade de sua declaração, entretanto, levantou várias dúvidas. Ao dizer que assumia a decisão do povo catalão, o líder separatista estava mesmo proclamando a independência? Ou, ao pedir a suspensão do processo, estava apontando parta um caminho diferente?
Em resposta, o primeiro-ministro espanhol, Mariano Rajoy, fez um requerimento formal para que a Generalitat (como é conhecido o governo catalão) confirmasse se declarou ou não a independência da região.
Segundo o jornal espanhol El País, se a declaração unilateral de independência for confirmada, o governo central poderia intervir na região, assumindo o seu controle político e financeiro - conforme previsto no artigo 155 da Constituição espanhola.
Puigdemont está sob intensa pressão. Além de ser questionado pelo governo central pela falta de clareza, ele foi criticado por defensores do separatismo, que organizaram uma manifestação nos arredores do Parlamento catalão.
O governo central espanhol vê como inconstitucional a tentativa da região de se separar do país - e não reconhece o recente referendo em que uma ampla maioria de catalães disse "sim" a essa opção (90% dos 2,2 milhões de eleitores que foram às urnas na votação que atraiu apenas 43% do eleitorado).
Logo após Puigdemont pedir o diálogo, 72 deputados (de um total de 135) assinaram um documento declarando a formação da "República catalã, como um Estado independente e soberano". Eles chegaram a cantar o Els Segadors, hino da Catalunha.
A que pode acontecer agora?
A declaração desse grupo de deputados, contudo, não foi registrada oficialmente tampouco discutida ou votada e por isso a mídia espanhola acredita que ela não tenha valor legal.
O cronograma aprovado pelo Parlamento previa que, após a aprovação pelo referendo, a independência fosse declarada junto com a proclamação formal do resultado e que, em seguida, fosse iniciado o "processo constituinte", com a criação de leis de transição.
Mas a pressão do governo central tirou esse caminho dos eixos.
Josep Rull, que comanda a pasta de Territorialidade e Sustentabilidade do governo catalão, disse que o líder do governo local pediu a suspensão da lei de transição. "Assim, suspende a efetividade da declaração de independência com o objetivo de abrir um processo de diálogo e é isso que esperamos", afirmou Rull.
O futuro ainda é incerto porque os sinais de Madri eram de que o governo central não estaria disposto a negociar - tampouco de aceitar uma mediação internacional para solucionar a crise política. Também não está claro se haverá interdição na região autônoma.
O que busca o governo catalão?
O líder catalão fez questão de dizer que a suspensão do processo de independência foi um "gesto de generosidade" que conta com uma resposta mais favorável do governo central ao diálogo.
Artur Mas, ex-presidente catalão, viu o ato de Puigdemont como uma "oferta" para o diálogo. "A oferta que faz o presidente Puigdemont é: há que respeitar o resultado de 1º de outubro (data do referendo), mas, como ele mesmo anunciou, os efeitos da consulta estão temporariamente suspensos. Isso abre a possibilidade de um diálogo com o Estado espanhol."
Mas uma coisa é o que o governo catalão diz querer e outra, o que fará.
"Foi uma declaração um pouco estranha e ambígua", disse à BBC Mundo Lluis Orriols, professor da Universidade Carlo III e analista político.
A vice-primeira ministra espanhola, Soraya Sáenz de Santamaría, diz que uma mediação não pode ser imposta por Puigdemont nem por outra pessoa sem que a "legalidade seja retomada".
"Não se pode tomar conclusões nem falar em consequências de uma lei que não existe, de um referendo que não tem efeito", afirmou.
O governo central ameaça acionar o artigo 155 da Constituição espanhola e, assim, anular a autonomia que a Catalunha desfruta hoje.
Analistas acreditam que o clima de tensão e de incerteza continuará nos próximos dias. Os efeitos dessa turbulência política, contudo, já podem ser notados. Empresas e bancos já falam em transferir suas respectivas sedes para outras cidades.
Fonte: BBC
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