Durante celebração do Dia Mundial do Refugiado em Brasília
(26 jun. 2018), as irmãs receberam do Governo Federal o status de apatridia e
poderão ser naturalizadas brasileiras.
“Agora falta pouco!” exclamou aliviada a filha de sírios
nascida no Líbano e quase brasileira Maha Mamo, de 30 anos. Todas essas
designações têm uma relação com sua história de vida: apátrida desde que
nasceu, ela e a irmã estão mais próximas de conseguirem a naturalização
brasileira.
Após decisão do Ministro da Justiça, Torquato Jardim, Maha e
Souad Mamo se tornaram ontem as primeiras pessoas reconhecidas pelo Governo
Brasileiro como apátridas. Este é o primeiro passo para que as irmãs, que moram
há cerca de quatro anos no Brasil como refugiadas, possam trocar a Carteira de
Registro Nacional Migratório por um RG (Registro Geral) brasileiro.
Para obterem a cidadania, é necessário ainda prestar a prova
Celpe-Bras, o Certificado de Proficiência em Língua Portuguesa para
Estrangeiros. A prova delas está marcada para o dia 1º de outubro, em Porto Alegre.
“Quero poder dizer que eu pertenço a algum lugar. De saber
que lá, eu existo.”
Mas ter a naturalização no Brasil significa muito mais do
que possuir um novo documento. Para Souad, ter uma identidade brasileira
significará finalmente existir para o resto do mundo. “Quero um futuro pelo
mundo. Com presença, existência, e sem medo de não ter uma pátria. Quero poder
dizer que eu pertenço a algum lugar. De saber que lá, eu existo.”
Para Maha, que é ativista pelos direitos dos apátridas, “o
passo mais importante que o Brasil deu com a nova lei de migração, no sentido
de acabar com a apatridia, foi criar uma definição do que é ser apátrida, algo
que não existia na legislação brasileira. Com essa definição, é possível
facilitar a naturalização das pessoas apátridas no Brasil”, diz.
De acordo com estimativas do ACNUR (Agência da ONU para
Refugiados), existem aproximadamente 10 milhões de pessoas em todo o mundo que
não possuem nacionalidade, ou seja, são apátridas. Por não possuírem uma
certidão de nascimento e, consequentemente, outros documentos de identidade,
muitas vezes elas são impedidas de ir à escola, consultar um médico, trabalhar,
abrir uma conta bancária, comprar uma casa ou se casar formalmente.
Este é o caso das irmãs Maho. Filhas de pais sírios, elas
nasceram no Líbano e não foram consideradas cidadãs em nenhum dos dois países.
Como a Síria não reconhece o casamento inter-religioso, o pai cristão e a mãe
muçulmana tiveram que fugir para o Líbano para se casar. Lá, nasceram as
filhas, que não foram reconhecidas como libanesas.
As leis no Líbano não reconhecem como cidadãos filhos de
pais que não são libaneses. Apesar dos seus pais serem sírios, eles possuíam
religiões diferentes e, por isso, não foi possível registrar o casamento nem o
nascimento dos filhos, o que impediu Souad e Maha de serem reconhecidas como
cidadãs sírias e de obter os documentos que o provam.
O procedimento de reconhecimento da apatridia passou a
existir no Brasil com a lei 13.445, aprovada em 2017 e mais conhecida como a
“Lei de Migração”. As irmãs sentem orgulho de serem as primeiras beneficiárias
da resolução, mas não querem parar por aí. “Agora queremos levar essa lei do
Brasil para o mundo e, assim como no futebol, poderá ser um exemplo para os
outros países neste tema.”
Sobre a apatridia: O Brasil é signatário da Convenção sobre
o Estatuto dos Apátridas de 1954 e da Convenção das Nações Unidas para a
Redução dos Casos de Apatridia de 1961. O enfrentamento da apatridia também é
um dos eixos do Plano de Ação do Brasil, aprovado em dezembro do ano passado em
Brasília, durante reunião ministerial que celebrou o 30º aniversário da
Declaração de Cartagena.
Os 28 países e três territórios da América Latina e do
Caribe que aderiram ao Plano de Ação do Brasil se comprometeram a erradicar a
apatridia na região até 2024 – em linha com a estratégia global do ACNUR.
Fonte: ACNUR
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