Em meio à preparação do país para a Copa do Mundo de 2014 e os Jogos Olímpicos de 2016, a União tem promovido licitações para contratação de obras de infraestrutura, delegação da exploração de bens públicos, bem como concessão de serviços públicos. E há a expectativa de novas licitações sejam realizadas em breve. Entre os potenciais objetos estão rodovias, aeroportos e o trem-bala que ligaria Rio de Janeiro, São Paulo e Campinas.
Os vencedores de tais procedimentos licitatórios deverão se engajar em empreendimentos de grande escala e altíssima complexidade, nos quais, possivelmente, surgirá uma gama de controvérsias com reflexos, entre outros aspectos, em prazos e preços contratuais.
Diante desse cenário, uma questão para a qual convém que administradores públicos, empresários e advogados estejam atentos é a seguinte: qual seria o método de solução de litígios mais adequado para grandes contratos de empreitada e outros contratos sofisticados que envolvam o cumprimento sucessivo de obrigações?
Atualmente, muito se tem falado na figura do Dispute Board ("DB"), que, tipicamente, é um comitê independente e imparcial, composto por especialistas em determinada área de conhecimento, nomeados pelas partes para examinar e administrar seus conflitos contratuais.1
A prática, sobretudo em empreitadas, tem sido estabelecer que, uma vez surgida a controvérsia, as partes a submetam ao DB. Familiarizado com os termos usualmente empregados na indústria específica do contrato e com os problemas habitualmente enfrentados na sua execução, o DB assiste, profissionalmente, as partes na resolução de controvérsias. As modalidades mais comuns de DB são o Dispute Review Board ("DRB"), cujas manifestações têm natureza de mera recomendação, e o Dispute Adjudication Board ("DAB"), cujas determinações constituem para as partes obrigação equiparável a uma obrigação contratual.
Ocorre que o pronunciamento do DB não é vinculante e, portanto, não impede a rediscussão da questão no Judiciário ou em sede arbitral. Por isso, embora frequentemente funcione para resolver conflitos de menor importância, o DB, no caso de controvérsias mais complexas, por vezes pode ser tratado pelas partes como uma mera etapa pré-judicial ou arbitral.
De fato, em disputas intrincadas, o DB, que se destinaria a administrar eventuais conflitos no curso da obra, de modo a não comprometer seu cronograma, acaba por se tornar só mais um capítulo na busca das partes por uma solução definitiva para o impasse, prolongando-o desnecessariamente e, com isso, atrasando a execução do contrato e, em última análise, desvirtuando a finalidade precípua do instituto.
Existe, porém, interessante alternativa ao DB para a solução de controvérsias advindas de grandes contratos de empreitada e contratos sofisticados que envolvam o sucessivo cumprimento de obrigações: a "fast-track arbitration". Assim chamada no cenário internacional, consiste em procedimento arbitral simplificado, que visa a uma solução célere e definitiva de disputas.
Em regra,2 o procedimento adotado para a fast-track arbitration assemelha-se ao praticado em DBs quando verificada uma disputa concreta, com a vantagem de que a sentença proferida pelo tribunal arbitral, que igualmente poderá ser composto por especialistas na matéria objeto do contrato, não poderá ser revista pelo Judiciário (ou em outra arbitragem)3. A principal desvantagem da fast-track arbitration é a de que, em razão da sua natureza mais simples e expedita, o desenvolvimento de argumentos e a produção de provas fica, em certa medida, restrita (mas não deixa de ser assegurada). Prestigia-se a celeridade em detrimento da análise mais aprofundada dos fatos.
O procedimento simplificado, contudo, não compromete as inafastáveis garantias previstas na Lei de Arbitragem, especialmente no que se refere ao contraditório, à ampla defesa e ao devido processo legal.
As partes interessadas em submeter-se a esse tipo de procedimento podem fazê-lo por meio da inclusão de cláusula compromissória em seu contrato, com mera referência às regras sobre fast-track arbitration constantes de regulamento de instituição arbitral (como é o caso, por exemplo, da American Arbitration Association),4 ou com a descrição de regras específicas desenvolvidas pelas partes, que sejam adequadas às peculiaridades do contrato.
Portanto, em vista das vantagens e desvantagens relacionadas ao recurso a DBs e à fast-track arbitration, convém que as partes contratantes avaliem cuidadosamente o método de solução de conflitos que melhor atenda ao objeto do contrato que está sendo celebrado.
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1 Os membros do Dispute Board podem ser preestabelecidos contratualmente ou o contrato pode prever que, diante de cada disputa concreta, as partes indiquem o membro de sua confiança e os membros indicados pelas partes nomeiem um terceiro especialista para compor o comitê.
2 Diz-se “em regra” porque as partes podem livremente pactuar o procedimento a ser adotado na fast-track arbitration.
3 A rigor, nas hipóteses dos vícios previstos no art. 32 da Lei de Arbitragem, é cabível ação anulatória da sentença arbitral, conforme o disposto no art. 33 dessa mesma Lei.
4 É indispensável verificar se o regulamento da instituição arbitral eleita pelas partes efetivamente tem regras sobre fast-track arbitration e se essas regras atendem os interesses das partes.
Fonte: Migalhas
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