terça-feira, 30 de abril de 2013

O Mercosul e sua maioridade

Por Welber Barral
Este artigo discute iniciativas que dão continuidade ao processo de integração do Mercosul, mesmo em meio às dificuldades enfrentadas. O autor argumenta que a “maioridade” do bloco dependerá de sua contribuição à integração produtiva regional, bem como da previsibilidade de suas regras.

O Mercado Comum do Sul (Mercosul) já alcançou duas décadas, mas, ao completar a maioridade, é preciso analisar o caminho que o processo de integração poderá seguir nos próximos anos, diante dos desenvolvimentos políticos e institucionais recentes. É verdade que o processo tem sido errático, envolvendo as metas irrealistas estabelecidas em Assunção, o choque de realidade em Ouro Preto, o crescimento dos anos 1990, o período apocalíptico dos anos 2000 e os retrocessos e a imprevisibilidade após a crise financeira mundial de 2008. Ao longo desse período, otimistas e pessimistas têm revezado suas análises, ora justificando a continuidade da experiência de integração, ora decretando seu óbito.



Para os otimistas, o Mercosul segue como um projeto político justificável, na medida em que foi o mecanismo responsável por reduzir o potencial de conflito regional, especialmente entre Argentina e Brasil. Ao mesmo tempo, argumenta-se, a integração regional ainda é vista como instrumento capaz de atribuir maior importância para as economias menores do bloco.
Para os pessimistas, os problemas enfrentados pelo bloco tornam o Mercosul uma experiência fracassada, seja por conta do aumento nos conflitos comerciais e políticos, seja em função das dificuldades em aprofundar o processo de integração, além da falta de um plano claro de ação dos Estados membros.
O fato é que o Mercosul já gerou efeitos duradouros especialmente em termos de comércio entre seus membros. Nos últimos dez anos, as importações e exportações regionais aumentaram exponencialmente em termos de valor e volume (ver Gráficos 1 e 2).
As exportações brasileiras para os parceiros regionais aumentaram de US$ 6,3 para US$ 27,8 bilhões, com aumento de 353,3% para a Argentina; 311,6% para o Paraguai; e 238% para o Uruguai entre 2001 e 2011. Ao mesmo tempo, as importações brasileiras dentro do Mercosul passaram de US$ 7 bilhões para US$ 19,3 bilhões no mesmo período, com aumento de 172,4% das importações a partir da Argentina, 248,6% do Uruguai e 138,5% do Paraguai. Os principais itens exportados incluem veículos e peças, máquinas e equipamentos e petróleo e derivados, enquanto os importados incluem veículos e peças, cereais e petróleo e derivados.
No caso da Argentina, as exportações aumentaram de US$ 7,4 bilhões em 2001 para US$ 20,7 bilhões em 2011. Nesse período, as vendas para o Brasil aumentaram em 179,5%, 174,1% para o Paraguai e 168,3% para o Uruguai. Quanto às importações, as compras argentinas intrazona passaram de US$ 5,9 bilhões para US$ 22,1 bilhões, com aumento das importações a partir do Brasil em 298,4%, 78,9% do Uruguai e 67,6% do Paraguai. Os principais itens exportados incluem veículos e peças, petróleo e derivados e cereais, enquanto os importados são compostos principalmente por veículos e peças e maquinários.
As exportações do Paraguai passaram de US$ 519 milhões para US$ 2,8 bilhões nesse período, com aumento de 1499% das vendas para a Argentina, 489,7% para o Uruguai e 181,7% para o Brasil. As importações intrazona passaram de US$ 1,2 bilhão para US$ 5,1 bilhões, com aumento de 437,1% nas importações a partir do Brasil, 229,9% da Argentina e 168,2% do Uruguai. A análise da composição das exportações mostra concentração em produtos primários como soja, cereais e óleo vegetal. Os principais produtos importados são petróleo e derivados, máquinas e equipamentos e fertilizantes.
No Uruguai, o mesmo processo foi observado. As exportações intrazona passaram de US$ 840 milhões em 2001 para US$ 2,4 bilhões em 2011, com aumento de vendas de 278,1% para o Brasil, 138,7% para o Paraguai e 89,7% para a Argentina, enquanto o valor total de compras intrazona passou de US$ 1,3 bilhão para US$ 3,9 bilhões no mesmo período. As exportações uruguaias para o Paraguai aumentaram em 345,6%, 205,5% para o Brasil e 182,3% para a Argentina. As exportações concentram-se em cereais, plásticos, malte, veículos e partes, enquanto as importações são compostas principalmente por petróleo e derivados, veículos e partes e máquinas e equipamentos[i].
Apesar de significativos, os avanços comerciais sofrem com a falta de consenso sobre o projeto de desenvolvimento regional. Enquanto a Argentina aderiu ao liberalismo nos anos 1990, o Brasil manteve um alto grau de intervenção no mercado. Quando o Brasil passou a buscar uma maior liberalização comercial na década seguinte, a Argentina voltou a aderir a discursos pré-cepalinos de industrialização forçada.
A verdade é que um projeto de integração exige consenso sobre temas como intervenção, velocidade de liberalização e consolidação institucional. No Mercosul, não se chegou a pensar nisso de maneira sistematizada e antecipada. A flexibilidade institucional, louvada como uma das qualidades do bloco, materializou arranjos improvisados e sem previsibilidade de longo prazo.
Aliado a isso, nos últimos anos o projeto de integração tornou-se ainda mais complexo – e distante – com o surgimento de novas barreiras comerciais e as consequentes retaliações. Os conflitos entre os países membros foram intensificados, com o aumento de medidas protecionistas, especialmente por parte de Argentina e Brasil. Só em 2010 o Global Trade Alert apontava a existência de 62 medidas protecionistas entre os países membros do Mercosul, a grande maioria por Argentina e Brasil, incluindo medidas sobre têxteis, papel, insumos para construção e metais[ii].
E não apenas o comércio extrazona foi afetado: a maior fonte dos conflitos foi a expansão, desde 2008, do uso argentino de licenças não automáticas para diversos produtos e o agravamento desse quadro em fevereiro de 2011. Essas medidas acabaram afetando diversos setores, inclusive aqueles com elevado grau de integração produtiva – como no caso automotivo, importante não apenas em termos de produção industrial, mas também para o comércio bilateral com o Brasil. Essa situação persiste, apesar da medida adotada pelo governo argentino em finais de janeiro de 2013, que revogou 17 licenças não automáticas envolvendo papel, brinquedos, bolas, calçados, motos, pneus para bicicletas e automóveis, parafusos, autopeças, produtos metalúrgicos e têxteis, entre outros produtos[iii].
Outras fontes de instabilidade para o processo de integração, no último ano, foram a entrada da Venezuela no Mercosul e a suspensão do Paraguai. Esses fatos colocaram à prova o arcabouço normativo e institucional do Mercosul, que teve que dar resposta a mudanças importantes na constituição e procedimentos do bloco. A Venezuela ainda está se adequando às regras do Mercosul, processo esse que deve levar ainda algum tempo, e os impactos comerciais de sua entrada no bloco ainda precisam ser medidos. De qualquer forma, com a adesão da Venezuela, o Mercosul passou a ter 83,2% do produto interno bruto (PIB) da América do Sul e 70% de sua população[iv]. No caso do Paraguai, a suspensão deve vigorar pelo menos até meados de 2013, após as eleições presidenciais no país.
No entanto, não somente de problemas vive o Mercosul. Há iniciativas voltadas à superação de algumas barreiras ao processo de integração, tais como a existência de assimetrias entre os membros do bloco e a necessidade de aprofundar a integração produtiva regional. Para superar as assimetrias, ficou clara a necessidade de adotar políticas e instrumentos como o Fundo de Convergência Estrutural do Mercosul (FOCEM, sigla em espanhol), cujo objetivo é financiar programas, fortalecer o processo de integração e promover coesão social. No caso da integração produtiva, a ideia é adotar iniciativas públicas que visem à criação de cadeias produtivas regionais. Alguns programas já estão em andamento em setores específicos, como automóveis, petróleo e gás e pequenas e médias empresas[v].
O Mercosul também tem avançado um pouco mais na celebração de acordos de comércio extrarregionais, além dos celebrados no quadro da Associação Latino Americana de Integração (ALADI). Nos últimos anos foram assinados acordos de livre comércio com Israel (em vigor desde 2010), Egito (pendente de ratificação) e Palestina (pendente de ratificação); além de acordos de preferências com Índia, em vigor desde 2009, e União Aduaneira da África Austral (SACU, sigla em inglês),pendente de ratificação. Tais acordos são limitados em número e abrangência, mas representam um avanço em relação à quase inércia anterior[vi].
Ao mesmo tempo, a retomada das negociações com a União Europeia (UE) tem efeito positivo – embora apenas retórico até agora –, no sentido de maior liberalização. Em 2012 foram realizadas duas reuniões do Comitê de Negociações Birregionais no marco das negociações entre Mercosul e UE e, em setembro do mesmo ano, o governo brasileiro instituiu consulta pública, direcionada aos setores produtivos brasileiros sobre essas negociações[vii]. O objetivo era atualizar o posicionamento do setor privado sobre o acesso ao mercado europeu, sobretudo diante da exclusão de Brasil, Argentina, Venezuela e Uruguai do Sistema Geral de Preferências (SGP) da UE em 1º de janeiro de 2014.
O resultado da consulta pública foi positivo, de acordo com os dados da Coalizão Empresarial Brasileira (CEB): há muito interesse por parte do setor empresarial brasileiro, e as respostas incluíram quase 70% do volume de comércio Brasil-UE. O resultado oficial do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (MDIC) não foi publicado, mas, de acordo com o Departamento de Negociações Internacionais do MDIC, os números da oferta brasileira são positivos e tornam viável a negociação com o bloco europeu. Isso viabilizaria uma oferta concreta, que atende quase totalmente à demanda europeia de que o acordo inclua aproximadamente 90% do fluxo de comércio.
Não foi fixado um prazo concreto para que as Partes troquem ofertas, mas a expectativa é de que as negociações prossigam em 2013, mesmo com as particularidades institucionais do Mercosul e as dificuldades econômicas enfrentadas pela Europa. Nesse cenário, no último trimestre de 2013 poderiam ser trocadas ofertas de acesso a mercado. E, apesar das dificuldades em alcançar consenso dentro do Mercosul acerca dos interesses envolvidos nas negociações – especialmente com relação à questão agrícola e à posição da Argentina, que tem adotado medidas protecionistas nesse setor –, não há possibilidade de que os Estados membros negociem de forma isolada.
Esse panorama aponta para a continuidade do processo de integração do Mercosul, independentemente das dificuldades e problemas, especialmente quando se leva em consideração o aspecto econômico-comercial. E a justificativa econômica do Mercosul é voltar a simplificar o trânsito de fatores produtivos, desde transportes até investimento. Há setores com boas perspectivas (petróleo e gás, por exemplo), nos quais acordos empresariais dependem de regras mais claras sobre compras públicas e menos burocracia. Ou seja, a previsibilidade de regras dentro do bloco é essencial para que se possa avançar um processo de integração real.
O investimento capaz de gerar escala de produção, mercado consumidor integrado, marcas regionais e logística competitiva, foge da imprevisibilidade e da possibilidade de custos de transação não previstos, como são as licenças, declarações, burocracia e multas. Ao final, o protecionismo, justificado pela busca da reindustrialização, acaba por espantar o investimento.
Esse corolário ainda precisa tornar-se um consenso entre as políticas econômicas dos Estados membros. O Mercosul seguirá seu caminho, e é preciso buscar alternativas para que sua consolidação seja mais rápida. Não há alternativa, entretanto, à redução do protecionismo e à adoção de medidas que conduzam a um ambiente favorável ao investimento.
* Professor de Negociações Comerciais Internacionais (Instituto Rio Branco). Consultor em comércio internacional.
[i] Balança Comercial 2001-2011 (SECEX/MDIC).
[ii] Disponível em: <http://www.globaltradealert.org/>.
[iii] Ver: Resolução 11/2013.
[iv] Disponível em: <http://www.brasil.gov.br/para/invest/international-partnerships/mercosul/br_model1?set_language=en>.
[v] Disponível em: <www.abdi.com.br>.
[vi] Dados disponíveis no sítio do MDIC.
[vii] Ver: Circular SECEX nº 44/12.

quinta-feira, 25 de abril de 2013

Sentença estrangeira já tramita como processo eletrônico

Desde o último dia 15 de abril, todos os processos envolvendo sentença estrangeira que ingressam no Superior Tribunal de Justiça (STJ) estão tramitando eletronicamente. Este é mais um passo para a universalização do processo eletrônico.
A homologação de sentença estrangeira é um processo que confere eficácia a ato judicial estrangeiro. Atualmente, 935 processos do tipo tramitam no STJ, entre eles, 370 já ingressaram no Tribunal por meio eletrônico. O acervo físico está sendo digitalizado e a expectativa é que todos os processos tramitem eletronicamente até meados de maio.
O processo eletrônico agiliza a tramitação e facilita o trabalho do advogado. O profissional que utiliza o meio eletrônico nos processos de homologação não fica submetido ao horário de atendimento do Tribunal – de onze horas da manhã às sete horas da noite –, já que a petição eletrônica é protocolada até à meia-noite. No formato papel, se a petição chega após as sete horas da noite, ela só será digitalizada e protocolada no dia seguinte. 

Fonte: Portal STJ

quarta-feira, 17 de abril de 2013

EUA rejeitam poder de veto para novos membros do Conselho de Segurança da ONU


Os Estados Unidos defendem uma reforma do Conselho de Segurança da ONU em que os novos membros não tenham poder de veto, disse hoje (17) a representante americana nas Nações Unidas, Susan Rice. Ela se reuniu com o ministro das Relações Exteriores do Brasil, Antonio Patriota, e falou sobre a aspiração brasileira a uma cadeira permanente no conselho.
A embaixadora afirmou que os Estados Unidos reconhecem a crescente responsabilidade global do Brasil e apreciam a aspiração brasileira a uma cadeira permanente. Entretanto, a embaixadora esquivou-se de comentar um possível apoio formal à candidatura brasileira.
“A legitimidade do conselho se beneficiaria com uma modesta expansão dos membros permanentes e não permanentes, em que os novos membros não tenham poder de veto”, afirmou a embaixadora após a reunião com Patriota.
Susan Rice disse que o Conselho de Segurança da ONU “precisa refletir o século 21”. Atualmente, são cinco lugares permanentes e dez rotativos. A estrutura foi montada após a 2ª Guerra Mundial. Em resposta, Patriota disse que a ampliação do número de membros permanentes e rotativos seria um primeiro passo para atualização do conselho.