domingo, 29 de abril de 2012

Entrevista com Amartya Sen: "Mercados, justiça e liberdade"


Para o prêmio Nobel indiano, a expansão das economias baseadas na livre-iniciativa deve ocorrer ao mesmo tempo em que se ampliam os investimentos sociais feitos pelo governo

Amartya Sen
Amartya Sen: ''O crescimento não deve ser um fim em si, mas um meio de alcançar avanços sociais e beneficiar a população'' 
Amartya Sen, 78 anos, cresceu em uma Índia imersa na ruína econômica e social. Filho de um professor universitário, conviveu com a miséria extrema, a sangrenta guerra separatista do Paquistão, o desmonte do Império Britânico e viu a fome matar pelo menos 3 milhões de pessoas em Bengala. Em 1998, ele recebeu o Nobel de Economia por sua formulação original sobre o desenvolvimento, processo que passou a ser visto como uma extensão das liberdades para trabalhar, consumir, dispor de saúde e educação de qualidade e expressar livremente os pensamentos. Graças a Sen, um dos criadores do Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), o avanço dos países não é mais medido apenas pelo crescimento da economia. Ele esteve em São Paulo como palestrante do encontro Fronteiras do Pensamento.
A última vez que o senhor esteve no Brasil foi há mais de dez anos. Qual a sua avaliação da evolução brasileira nesse período? A economia brasileira passa por um bom momento. Não falo apenas em termos de crescimento, que permanece mais robusto do que aquele visto na Europa e nos Estados Unidos. O importante é que o país tem distribuído os recursos gerados pelo aumento de sua riqueza. Houve uma melhora indiscutível nos indicadores sociais. Agora, para sustentar o crescimento e consolidar os avanços conquistados, será preciso aprimorar a educação e também o sistema público de saúde, tanto em termos de cobertura da população como no que diz respeito à qualidade.
Mas o Brasil cresce em uma velocidade inferior à de outros países em desenvolvimento... O Brasil realmente não vem crescendo tão rápido quanto a China ou mesmo a Índia, mas exibe muitas vantagens em relação àqueles países. A China enfrenta uma constante tensão política por não ser um país democrático, embora seja um equívoco atribuir o crescimento da economia chinesa ao autoritarismo. A China cresce rapidamente porque nos últimos trinta anos sua economia é aberta e receptiva aos mercados. A Índia, por sua vez, teve períodos de crescimento tépido, mesmo sendo uma democracia. Passou a avançar mais rapidamente depois que decidiu implantar políticas mais favoráveis aos investidores privados. Mas a renda per capita indiana ainda é muito baixa e os indicadores sociais evoluem lentamente. Nesse aspecto, a evolução verificada na sociedade brasileira tem sido bem mais expressiva.
Por que essa avaliação negativa da Índia, um dos países que mais crescem no mundo?  A economia indiana deverá sentir uma desaceleração, baixando sua taxa anual de expansão dos atuais 9% para algo em torno de 7%. Ainda assim, nos próximos anos, o PIB indiano continuará crescendo em um ritmo superior ao da média mundial. O que mais me preocupa com relação ao futuro da Índia é o fato de o país ter se mostrado incapaz de partilhar os frutos do crescimento. Não me refiro apenas à distribuição da renda. Falo da desigualdade de acesso ao ensino de qualidade. Para uma parte da população, a educação é excelente. Há pessoas capazes de competir em igualdade de condições com trabalhadores de outros países. Não são inferiores em nada, no preparo técnico e científico. Por outro lado, um terço dos indianos não tem acesso a esse sistema educacional mais avançado, enquanto uma parcela ainda maior não consegue sequer entrar no ensino primário. Esse é um quadro de extrema desigualdade. Há muita injustiça também no sistema de saúde. O serviço privado é ótimo, mas boa parte da população não possui cobertura ou assistência de nenhuma natureza.
O senhor começou a estudar o desenvolvimento econômico e social há quase seis décadas. Como avalia a evolução desses indicadores nesse período?  É inegável que houve uma evolução. Os níveis de pobreza estão em queda. Em diversos países, há milhões de pessoas deixando a pobreza e também muita gente enriquecendo. Houve progresso considerável na oferta e na qualidade do ensino, a saúde melhorou, vimos uma queda na desigualdade entre homens e mulheres. Aumentou muito a atenção às questões ecológicas, praticamente ignoradas antes. Ocorreu, no entanto, um retrocesso no que diz respeito à segurança — em parte por causa do extremismo religioso e também por conflitos militares.
Os governos tendem a focar suas ações no estímulo ao crescimento do PIB. Esse deve ser o principal objetivo de um governante? É um erro buscar o crescimento pelo crescimento, sem levar em conta os seus efeitos mais amplos e as suas consequências. É preciso ponderar, entre outros fatores, o impacto ambiental. É fundamental também usar os frutos do crescimento para aprimorar a qualidade de vida da população de maneira abrangente, e não apenas favorecendo certos grupos. A Índia teve uma expansão econômica, nas duas últimas décadas, mais elevada do que a de Bangladesh. A renda per capita indiana é hoje equivalente ao dobro da de Bangladesh. Porém, apesar de ter crescido menos, Bangladesh ultrapassou a Índia em diversos indicadores de desenvolvimento social. Precisamos prestar atenção em como tirar o melhor proveito do enriquecimento do país. O crescimento é um meio extraordinário de alcançar avanços sociais e beneficiar a população em geral, como já apontara Adam Smith (filósofo escocês, 1723-1790).
É um equívoco, então, ver o senhor como um cético do crescimento econômico? Não sou anticrescimento, de maneira alguma. Sou contra o crescimento pelo crescimento, e ofereço todas as minhas críticas àqueles que assim são. Mas àqueles que não buscam nenhum crescimento, como a Europa hoje em dia, minhas críticas são ainda mais severas. Adam Smith estava certo quando observou que o crescimento aumenta a renda da população e assim amplia a capacidade das pessoas de ter acesso a melhores condições de vida. Estava certo também quando disse que o crescimento gera os recursos necessários para que os governos possam exercer as suas atividades essenciais.
Os países europeus sentem o peso do aumento na dívida pública. Nesse caso, faz sentido conter as despesas do governo? Os cortes de gastos, se necessários, precisam ser seletivos. A Europa estaria em uma situação bem mais confortável, neste momento, se perseguisse políticas que estimulassem o crescimento em vez de concentrar seus esforços na austeridade. Nenhum país foi capaz, em toda a história, de reduzir a sua dívida pública em um contexto de ausência de crescimento econômico, como tentam fazer hoje alguns países europeus. Não faz sentido essa ideia de primeiro reduzir o endividamento para em seguida ver a economia avançar. Como resultado, a crise europeia é bem mais severa do que deveria ser. Mas, como disse anteriormente, a busca pelo crescimento não deve ser um fim em si mesmo, e sim uma maneira de aprimorar indicadores sociais, como saúde e educação — e também para reduzir o endividamento público, se preciso.
Qual o papel do estado no desenvolvimento dos países com economia baseada na livre-iniciativa? Desde o fim da II Guerra Mundial, um número crescente de países adotou sistemas econômicos baseados na economia de mercado e na livre-iniciativa. Houve também, ao mesmo tempo, um avanço nos gastos sociais pelos governos. O estado de bem-estar social (welfare state) foi estabelecido pelos europeus. Foram ampliadas as políticas de apoio aos desempregados. A expansão das economias de mercado ocorreu, portanto, simultaneamente ao avanço das políticas públicas de bem-estar social. Em grande medida, um processo se alimentou do outro. O Japão já fizera algo parecido a partir do fim dos anos 1860, depois da Restauração Meiji. Os japoneses deram ímpeto a políticas que favoreciam o crescimento acelerado tendo como base uma economia de mercado, mas com um forte investimento público em educação e saúde. Mais tarde o modelo japonês foi replicado por coreanos, por taiwaneses, por Hong Kong e, finalmente, pela China, depois de 1979. O papel do governo expandiu-se dramaticamente na segunda metade do século XX, ao mesmo tempo em que ocorria a expansão da democracia e das liberdades individuais.
Alguns analistas enxergam no custo elevado do estado de bem-estar social o maior obstáculo à recuperação europeia. Qual a sua avaliação? Discordo. A gigantesca crise financeira de 2008 teve início com falhas no funcionamento dos mercados financeiros. Mas, quando os governos gastaram bilhões para socorrer os mercados, os países acabaram acumulando dívidas colossais. Com exceção da Grécia, talvez, a culpa pela crise não pode ser debitada aos governos. As políticas sociais apenas se tornam um peso para o estado quando a economia permanece estagnada, porque aí não há os recursos necessários para financiar a assistência. Diversos países saíram da II Guerra com elevados níveis de endividamento. Como conseguiram reequilibrar suas finanças? Crescendo. Nos anos 90, o presidente americano Bill Clinton também precisou lidar com uma dívida pública elevada e, mais uma vez, a saída foi o crescimento, e não a austeridade. O frustrante é que essas questões já foram tratadas com grande clareza desde os tempos de Adam Smith. Um estado tem responsabilidades e deveres diante de sua população, e o meio de obter os recursos necessários às suas políticas é o livre mercado. É desse equilíbrio que necessitamos.
O senhor cita Adam Smith como um defensor desse equilíbrio entre estado e livre-iniciativa. Hoje, no entanto, o mais comum é Smith ser lembrado como o formulador do conceito da "mão invisível", a capacidade dos mercados de se autorregularem... Smith foi um pensador radical. Ele recebeu críticas da direita por defender a ampliação das liberdades individuais. Os revo­lucionários franceses devem muito às ideias de Smith. O marquês de Condorcet (filósofo francês, 1743-1794) e sua mulher, Sophie, traduziram textos de Smith para o francês. Qualquer um que defendesse a economia de livre mercado no século XVIII era sem dúvida um radical, porque não havia livre mercado. Mais tarde, quando o livre mercado passou a ser dominante, as pessoas continuaram a ler Smith — mas apenas quatro páginas, se tanto, e ignoraram completamente o resto de sua obra. Temos de ler e reler Smith, sempre.
O debate econômico atual está centrado em duas frentes. Uma, a dos seguidores de John Maynard Keynes (economista inglês, 1883-1946), propõe um aumento dos gastos públicos para estimular a demanda. A outra corrente, representada sobretudo pelos seguidores de Milton Friedman (economista americano, 1912-2006), condena o excesso de intervenções do governo. Quem está com a razão? Esse debate é um equívoco. Os seguidores de Friedman erram ao imaginar que a economia de mercado pode fazer tudo sozinha. É um modelo impossível de ser implementado no mundo real. Os keynesianos erram ao pensar que o mero estímulo da demanda vai resolver todos os problemas econômicos. Keynes tem relevância apenas quando estamos lidando com uma recessão. Mas ele diz muito pouco sobre o papel do governo como propulsor do desenvolvimento. Para saber como deve agir o estado, é preciso buscar respostas em Adam Smith, ou em Arthur Pigou (economista inglês, 1877-1959), que tratou de questões como pobreza, desigualdade, qualidade da moradia, educação. Keynes nada tem a acrescentar a respeito desses temas. O desenvolvimento resulta de investimentos em fatores cruciais como educação, saúde, segurança individual e, é claro, disseminação do conhecimento. Sinto pelos seguidores deles, mas em nenhum desses aspectos Keynes ou Friedman têm muito a dizer.
Que países são exemplos do equilíbrio que o senhor propõe? Não há nenhum país perfeito no mundo. Há lições para tirar de um ou de outro. Ninguém precisa copiar um modelo de país. O essencial é raciocinar a partir das ideias que funcionaram em outros lugares.
Fonte: Veja

quinta-feira, 26 de abril de 2012

Chamada de artigos e de novos avaliadores - Revista Espaço Jurídico /Journal of Law da Unoesc

A Revista Espaço Jurídico /Journal of Law da Unoesc faz chamada de artigos e de novos avaliadores.
Maiores informações podem ser obtidas abaixou ou no site oficial.
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quarta-feira, 18 de abril de 2012

A Shell e os Direitos Humanos: o caso Kiobel, na Suprema Corte dos EUA

Questões republicanas podem ser muito amplas. As responsabilidades cívicas, que normalmente são relacionadas a pessoas físicas, podem ser também atribuídas a pessoas jurídicas empresariais.
A rigor as empresas mantém, com tolerância de todas as democracias, um estreito relacionamento com os assuntos públicos: basta citar dois para evidenciar isso, licitações e contratos para prestação de serviços públicos e financiamento de campanhas eleitorais. Ninguém questiona a inconveniência dessas práticas cívicas. No entanto, a responsabilidade das empresas por assuntos de interesse coletivo, como a defesa dos direitos humanos, é mais controversa.
Exemplo disso é o debate atual que vem sendo travado na Suprema Corte dos Estados Unidos. Quem acompanhar o caso Kiobel vs. Shell vai se deparar com a seguinte questão: até que ponto a violação a direitos humanos pode ser atribuída a uma empresa norte americana? E se a violação ocorrer no exterior?
Depois de passar seis dias ouvindo argumentos no maior caso sobre direitos humanos e grandes corporações globais, caso em que se discute se as empresas americanas podem ser processadas por envolvimento em tortura no exterior, a Suprema Corte dos Estados Unidos pediu para as partes envolvidas resolverem uma questão ainda mais ampla.
A questão original que veio à tona no caso Kiobel v. Royal Dutch (Shell) Petroleum Company, n. 10.491, é saber se empresas americanas podem ser processadas, e condenadas, por tribunais dos Estados Unidos, por violações a direitos humanos cometidos no exterior.
Na última terça-feira (03.04.12) os juízes da Suprema Corte revelaram interesse em saber se os tribunais dos EUA nunca poderiam analisar esse tipo de caso, ou seja, se há, no direito norte-americano, algum impedimento para que os tribunais nacionais dos EUA analisem violações a direitos humanos no exterior se o acusado for uma corporação empresarial americana.
O caso foi apresentado por 12 nigerianos que disseram que a Shell, empresa petrolífera estrangeira, havia sido cúmplice na violação aos direitos humanos cometidos contra eles pela ditadura de Abacha, na região de Ogoni, na Nigéria entre 1992 e 1995. Essas violações incluiriam atos de tortura, execuções extrajudiciais e crimes contra a humanidade. A Corte de Apelação de Nova York decidiu, anteriormente, que empresas e organizações políticas não poderiam ser responsabilizadas por atos dessa natureza.
A Suprema Corte instruiu as partes a apresentam argumentos para interpretar a seção 28 do Código dos Estados Unidos, o Alien Tort Claims Act (ATCA), de 1789, que, a bem da verdade, não é um texto claro. Nele, se pode ler que os tribunais americanos estão autorizados a julgar qualquer conduta civil cometida por estrangeiro baseada em violações ao direito das gentes ou a Tratado assinado pelos EUA". Não fica claro se a conduta deve ser praticada exclusivamente por pessoas físicas ou se pessoas jurídicas também podem ser acusadas por elas.
Essa norma foi amplamente ignorada até a década de 1980, quando os tribunais federais começaram a aplicá-la em casos internacionais de direitos humanos. Numa decisão de 2004, no caso Sosa v Álvarez-Machain, a Suprema Corte abriu as portas para algumas situações protegidas pelo ATCA, as que envolvessem violações a normas internacionais com "conteúdo definido e aceito entre as nações civilizadas."
A advogada da Shell argumentou que a maior parte dos Tratados Internacionais prevê a responsabilização individual, não a responsabilização corporativa em casos assim. O argumento da acusação é que o direito dos EUA não faz esse tipo de distinção e que não seria legítimo fazê-lo diante de violações a direitos humanos. Por esse argumento, as Corporações Empresariais, que são pessoas jurídicas, deveriam responder pelas práticas previstas no Art. 28 do ATCA.
Em 2009, a Shell concordou em pagar US $ 15,5 milhões aos parentes das vítimasno que seesperava ser o fim de uma longa batalha jurídica potencialmente embaraçosa.
A Shell sustenta sua inocência em todo o processo, dizendo que o acordo foi um "gesto humanitário" para ajudar a região de Ogoni. No entanto, advogados dos direitos humanos em Nova York, há dois anos, saudaram o acordo como um precedente para a responsabilizar gigantes como aShell ​​pelas atividades de exploração petrolífera em países que são ditaturas ou que não respeitam os direitos humanos.

Fonte: República Inacabada

segunda-feira, 16 de abril de 2012

Processo seletivo de voluntários que atuarão na Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável

Estão abertas as inscrições para o processo seletivo de voluntários que atuarão na Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável (de 13 a 22 de junho de 2012). O prazo para inscrições é até o dia 19 de abril e os voluntários que atuarão nas mais diversas areas.


Para mais informações favor acessar o site oficial da Conferencia.